Documento:20001814352
Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 2ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5001237-67.2018.4.02.5106/RJ

RELATOR: Desembargador Federal JOSÉ ANTONIO LISBÔA NEIVA

APELANTE: RONALD FERNANDO DE CARVALHO BOTELHO JUNIOR (AUTOR)

ADVOGADO(A): LORENA CHIROL MACHADO COSTA (OAB RJ201655)

APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF (RÉU)

VOTO

Conheço da apelação, porque presentes os pressupostos de admissibilidade.  

Como relatado, trata-se de apelação cível interposta contra a sentença constante do evento 91 que julgou improcedente o pedido.

O Juiz de primeiro grau entendeu pela inexistência de cláusulas abusivas no contrato firmado entre as partes, considerando que “alterações salariais, perda de emprego, dificuldades financeiras, separação conjugal e demais situações nesse sentido, são passíveis de ocorrer durante um financiamento longo, principalmente como no presente caso, (...) um financiamento pactuado em 180 meses (15 anos)”, ficando o mutuário “sujeito a arcar com as obrigações do contrato quando da ocorrência desse tipo de situação”. Salientou que, na busca de uma revisão contratual, o autor apenas relatou problemas de saúde, redução da renda e dificuldades financeiras de arcar com as prestações do financiamento do imóvel, situações que não autorizam a pretendida revisão contratual. E determinou à CEF que apresentasse o valor atualizado do débito para que o pagamento seja efetuado com o valor depositado judicialmente e o excedente entregue ao autor.

O apelo do autor discute, em essência, o valor do débito apresentado pela CEF em R$ 285.281,17, discordando da inclusão de juros, correção monetária, multa e taxa de ocupação, bem como da ausência de abatimento proporcional das parcelas futuras, além da data limite de atualização da dívida. Subsidiariamente, entendendo-se pela legalidade da cobrança da taxa de ocupação, defende a cobrança de valor similar ao de um contrato de locação.

No decorrer do processo, foi deferida a substituição da garantia dada (alienação fiduciária) ao pagamento da dívida decorrente do empréstimo e cumprimento das obrigações correlatas ao contrato de mútuo por depósito judicial do produto da venda do imóvel, conforme decisão contida no evento 60 de 15/01/2020 e anuência da CEF (evento 56). Na mesma decisão foi determinada a intimação do autor para que efetuasse o depósito judicial no valor da transação imobiliária (R$ 310.000,00) para, após comprovação, ser expedido ofício ao Cartório de Imóveis correspondente para cancelamento do registro da propriedade fiduciária.

A CEF apresentou o demonstrativo atualizado da dívida em 22/08/2019 no montante de R$ 285.281,17 (evento 44), tendo o autor impugnado a inclusão da quantia referente à taxa de ocupação (evento 48).

Com a comprovação do depósito judicial, conforme evento 71 – COMP2, efetuado em 17/02/2020, foi oficiado o Cartório de Imóveis, que informou o cancelamento da alienação e da consolidação de propriedade (evento 77).

Pois bem, passo a analisar as razões do apelo.

Quanto à inclusão de juros, correção monetária e multa, tais encargos de mora decorrem de expressa previsão contratual quando há inadimplência, conforme cláusula vigésima quarta, parágrafo primeiro (evento 1 – CONTR14 – fl. 2). Não há como serem afastados tais encargos ante a inadimplência confessada pelo próprio autor desde o início do contrato, já que pagou somente três prestações de um contrato firmado em 31/07/2014 para pagamento em 180 meses (evento 1 – CONTR13 e CONTR14).

Em que pese a narrativa do autor no que concerne aos problemas de saúde alegados e a perda de renda, como bem salientado na sentença, não se trata de situação imprevisível e tampouco ampara o pedido de revisão contratual, tendo em vista o longo prazo de financiamento firmado no caso concreto (15 anos). Ademais, conforme sua petição inicial, infere-se que o autor não possuía condições de se manter adimplente com o contrato.

Cumpre esclarecer, ainda, a posição da CEF no contrato, como credora fiduciária. O devedor, autor, alienou, em caráter fiduciário, o imóvel dado em garantia do pagamento da dívida contraída, conforme cláusula décima terceira (evento 1 – CONTR13 – fl. 5). O pagamento da dívida é obrigação do devedor, que poderia ter ajuizado ação de consignação em pagamento para evitar a mora e a consolidação da propriedade, o que não foi feito, ante a impossibilidade de manter o pagamento das prestações.

A tese de que a CEF demorou para consolidar a propriedade não socorre o apelante. Repita-se, a CEF era a credora fiduciária e a inadimplência do contrato não lhe pode ser imputada. O valor do débito cresceu ante a inadimplência antiga do contrato por conduta do autor, descabendo imputar à credora fiduciária a culpa pelo valor da dívida considerado exorbitante pelo devedor. Era responsabilidade do autor efetuar o pagamento das prestações. Com a inadimplência, ficou sujeito aos encargos de mora do contrato e, como já assinalado, não houve ajuizamento de ação de consignação em pagamento para evitar os efeitos da mora.

Quanto à alegada demora da CEF em anuir com a alienação do bem por terceiro para possibilitar a substituição da garantia, melhor sorte não tem o apelante.

O acordo só é possível mediante aceitação de ambas as partes e não pode ser imposto a nenhuma delas.

Ao contrário do alegado pelo apelante, observa-se que o autor informou ao Juízo de primeiro grau, em 20/03/2019, que havia conseguido um comprador para o imóvel (evento 10). A audiência de conciliação foi realizada em 24/04/2019 (evento 21), tendo sido deferido o prazo de 30 dias para que as partes estabelecessem um diálogo quanto aos valores e forma de pagamento, sem concretização de um acordo.

Contudo, como já salientado, no decorrer do processo, foi deferida a substituição da garantia dada (alienação fiduciária) pelo depósito judicial do produto da venda do imóvel, conforme decisão contida no evento 60 de 15/01/2020 e anuência da CEF, nos termos da petição protocolada em 23/09/2019 (evento 56) em resposta ao despacho proferido em 12/09/2019 (evento 52).

Houve anteriormente discussão sobre valores, tendo a CEF apresentado o demonstrativo atualizado da dívida em 22/08/2019 no montante de R$ 285.281,17 (evento 44) e o autor impugnado a inclusão da quantia referente à taxa de ocupação (evento 48).

Do narrado, o que se vê é que a CEF se manifestou nos autos sempre que instada pelo Juízo e não havia concordado em conciliar inicialmente (evento 28), direito seu, tendo, após mediação do Juízo de primeiro grau, aceitado a substituição da garantia pela depósito judicial.

A demora, portanto, decorreu das tentativas de se obter a conciliação, não havendo que se falar em violação à boa-fé, como defendido pelo apelante.

Ficou claro nos autos que o autor pretendia "congelar" a dívida, em razão dos problemas narrados por ele, o que não é possível, descabendo a teoria da imprevisão no caso concreto, como já assinalado, ante a inexistência de fatos imprevisíveis.

No que concerne à inclusão de honorários advocatícios no valor da dívida, verifica-se que não houve tal inclusão, nem no valor indicado com a contestação (evento 6 - ANEXO 2), tampouco no valor informado no cálculo apresentado no evento 44.

Em relação à alegação de abatimento das parcelas futuras, também se rejeita a tese do apelante. Não se trata de pagamento antecipado da dívida, e sim de vencimento antecipado da dívida por inadimplência (cláusula vigésima terceira), situações diversas. Houve legítima consolidação da propriedade por inadimplência, que, posteriormente, só foi cancelada em razão da substituição da garantia da alienação fiduciária pelo depósito judicial, como deferido pelo Juízo de primeiro grau. Destaque-se que a tutela de urgência não foi deferida, não havendo, assim, impedimento para que a consolidação da propriedade tivesse se realizado.

Quanto ao termo final para atualização do débito, a sentença resolveu, com acerto, a questão. De fato, deve-se atualizar a dívida até a data efetiva do depósito judicial, que ocorreu em 17/02/2020 (eventos 66 e 71). A CEF concordou com a substituição da garantia em 23/09/2019 (evento 56), tendo o autor apresentado petição comprovando a quitação do IPTU que se encontrava em atraso em 21/10/2019 (evento 59), quando solicitou o prosseguimento da alienação particular do bem ao comprador Paulo Henrique Bragança Branco.

Não tem amparo a tese de que a atualização da dívida deveria se dar até a data da audiência realizada em 24/09/2019. Não houve acordo em audiência, apenas foi dado prazo para que as partes conversassem sobre valores e forma de pagamento e informassem ao Juízo o "resultado das tratativas", no caso de haver a conciliação, por óbvio. A CEF foi clara pela negativa do acordo quando defendeu o indeferimento da tutela de urgência requerida após a audiência (evento 28). Somente após mediação do Juízo de primeiro grau, a CEF anuiu com a substituição da garantia. Assim, o termo final de atualização do débito só pode ser a data do depósito judicial, quando se efetivamente garantiu o credor.

Vale conferir trecho da sentença que rejeitou os embargos de declaração, esclarecendo o termo final da atualização da dívida (evento 113):

      "Quanto ao termo final da atualização do débito este deve ser a data do depósito judicial, conforme explicito na fundamentação da sentença (considerando que "uma vez quitadas as obrigações do fiduciante, o fiduciário já não preserva mais nenhum interesse no bem" (evento 31) e o depósito judicial efetuado em 17/02/2020, no valor de R$ 310.000,00 (evento 66), como garantia ao pagamento da dívida (estipulada em R$ 285.281,17, em agosto de 2019 - evento 44), não pode a CEF efetuar qualquer cobrança relacionada a dívida decorrente do empréstimo nº 155553144505 )".

No que concerne à tese de não se aplicar as regras do SFH no contrato firmado, deve ser esclarecido que o contrato firmado não está vinculado ao SFH, e sim ao SI (Sistema de Financiamento Imobiliário) pela garantia de alienação fiduciária, que atrai a aplicação da Lei nº 9.514/1997. A referida lei dispõe sobre o Sistema de Financiamento Imobiliário, institui a alienação fiduciária de coisa imóvel e dá outras providências. E trata da notificação para purga da mora e da consolidação da propriedade nos casos de inadimplência, dentre outros pontos.

Portanto, repita-se, aplica-se a Lei nº 9.514/1997 à hipótese dos autos em razão da alienação fiduciária de imóvel de propriedade do mutuário dado em garantia da dívida contraída no contrato de mútuo de dinheiro (evento 1 – CONTR13 – fl. 5).

Por fim, o apelante também impugna a inclusão da taxa de ocupação no valor da dívida. Igualmente sem razão o apelante.

Ao contrário do alegado pelo apelante, a taxa de ocupação decorre de previsão legal, após a consolidação da propriedade em favor da credora fiduciária, nos termos do art. 37-A da Lei nº 9.514/1997. Confira-se o teor do mencionado dispositivo:

"Art. 37-A.  O devedor fiduciante pagará ao credor fiduciário, ou a quem vier a sucedê-lo, a título de taxa de ocupação do imóvel, por mês ou fração, valor correspondente a 1% (um por cento) do valor a que se refere o inciso VI ou o parágrafo único do art. 24 desta Lei, computado e exigível desde a data da consolidação da propriedade fiduciária no patrimônio do credor fiduciante até a data em que este, ou seus sucessores, vier a ser imitido na posse do imóvel.     (Redação dada pela  Lei nº 13.465, de 2017)"

Não há que se falar em valor similar a de um aluguel, como defendido no apelo, já que deve ser observada a lei. Na hipótese, a taxa de ocupação é devida desde a data de consolidação da propriedade até a data do efetivo depósito judicial,  17/02/2020 (eventos 66 e 71), quando houve a substituição da garantia. Se não houvesse a substituição da garantia pelo depósito judicial, o termo final seria a data de imissão na posse do imóvel. Contudo, foi cancelada a garantia com o depósito judicial, ante a substituição deferida pelo Juízo de primeiro grau.

Destaque-se que, no cálculo apresentado na contestação, de 14/11/2018 (evento 6 - ANEXO2), não constava a taxa de ocupação porque ainda não havia sido consolidada a propriedade, esta ocorrida em 21/12/2018 (evento 44). No referido evento 44, constou o valor da dívida atualizado até 22/08/2019. Não se verifica, portanto, irregularidade na inclusão da taxa de ocupação no valor da dívida do mutuário.

A sentença, contida no evento 91 integrada pelo evento 113, de improcedência deve ser mantida, bem como os critérios de cálculo da dívida definidos pelo julgado.

Isto posto,    

Voto por conhecer da apelação e negar-lhe provimento, majorando a verba honorária fixada em 1% (art. 85, §11, do CPC).



Documento eletrônico assinado por MARCELLA ARAUJO DA NOVA BRANDAO, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 2ª Região nº 17, de 26 de março de 2018. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc.trf2.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 20001814352v3 e do código CRC 277250ff.

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Data e Hora: 4/4/2024, às 16:55:23

 


 


Documento:20001814353
Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 2ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5001237-67.2018.4.02.5106/RJ

RELATOR: Desembargador Federal JOSÉ ANTONIO LISBÔA NEIVA

APELANTE: RONALD FERNANDO DE CARVALHO BOTELHO JUNIOR (AUTOR)

ADVOGADO(A): LORENA CHIROL MACHADO COSTA (OAB RJ201655)

APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF (RÉU)

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATO DE MÚTUO DE DINHEIRO COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE IMÓVEL EM GARANTIA. SUBSTITUIÇÃO DA GARANTIA POR DEPÓSITO JUDICIAL. VALOR DA DÍVIDA.  RECURSO DESPROVIDO.

1. Apelação cível interposta em face de sentença que julgou improcedente o pedido da ação que objetiva a revisão contratual, determinando à CEF apresentar o valor atualizado do débito para que o pagamento seja efetuado com o valor depositado judicialmente e o excedente entregue ao autor, ante a substituição da garantia deferida pelo Juízo de primeiro grau. O apelo do autor discute o valor do débito apresentado pela CEF em R$ 285.281,17, discordando da inclusão de juros, correção monetária, multa e taxa de ocupação, bem como da ausência de abatimento proporcional das parcelas futuras, além da data limite de atualização da dívida.

2. A sentença entendeu, com acerto, pela inexistência de cláusulas abusivas no contrato firmado entre as partes, considerando que “alterações salariais, perda de emprego, dificuldades financeiras, separação conjugal e demais situações nesse sentido, são passíveis de ocorrer durante um financiamento longo, principalmente como no presente caso, (...) um financiamento pactuado em 180 meses (15 anos)”, ficando o mutuário “sujeito a arcar com as obrigações do contrato quando da ocorrência desse tipo de situação”. Salientou que, na busca de uma revisão contratual, o autor apenas relatou problemas de saúde, redução da renda e dificuldades financeiras de arcar com as prestações do financiamento do imóvel, situações que não autorizam a pretendida revisão contratual.

3. No decorrer do processo, foi deferida a substituição da garantia dada (alienação fiduciária) ao pagamento da dívida decorrente do empréstimo e cumprimento das obrigações correlatas ao contrato de mútuo por depósito judicial do produto da venda do imóvel. Com a comprovação do depósito judicial, efetuado em 17/02/2020, foi oficiado o Cartório de Imóveis, que informou o cancelamento da alienação e da consolidação de propriedade.

4. Quanto à inclusão de juros, correção monetária e multa, tais encargos de mora decorrem de expressa previsão contratual quando há inadimplência, conforme cláusula vigésima quarta, parágrafo primeiro. Não há como serem afastados tais encargos ante a inadimplência confessada pelo próprio autor desde o início do contrato, já que pagou somente três prestações de um contrato firmado em 31/07/2014 para pagamento em 180 meses.

5. In casu, a CEF era a credora fiduciária e a inadimplência do contrato não lhe pode ser imputada. O valor do débito cresceu ante a inadimplência antiga do contrato por conduta do autor, descabendo imputar à credora fiduciária a culpa pelo valor da dívida considerado exorbitante pelo devedor. Era responsabilidade do autor efetuar o pagamento das prestações. Com a inadimplência, ficou sujeito aos encargos de mora do contrato, destacando-se que não houve ajuizamento de ação de consignação em pagamento para evitar os efeitos da mora.

6. Quanto à alegada demora da CEF em anuir com a alienação do bem por terceiro para possibilitar a substituição da garantia, ressalte-se que o acordo só é possível mediante aceitação de ambas as partes e não pode ser imposto a nenhuma delas. Ao contrário do alegado pelo apelante, em audiência de conciliação realizada em 24/04/2019, foi deferido o prazo de 30 dias para que as partes estabelecessem um diálogo quanto aos valores e forma de pagamento, sem concretização de um acordo. A CEF se manifestou nos autos sempre que instada pelo Juízo e não havia concordado em conciliar inicialmente, direito seu, tendo, após mediação do Juízo de primeiro grau, aceitado a substituição da garantia pela depósito judicial. A demora, portanto, decorreu das tentativas de se obter a conciliação, não havendo que se falar em violação à boa-fé, como defendido pelo apelante.

7. Ficou claro nos autos que o autor pretendia "congelar" a dívida, em razão dos problemas narrados por ele, o que não é possível, descabendo a teoria da imprevisão no caso concreto, como já assinalado, ante a inexistência de fatos imprevisíveis.

8. No que concerne à inclusão de honorários advocatícios no valor da dívida, verifica-se que não houve tal inclusão, nem no valor indicado com a contestação, tampouco no valor informado no cálculo apresentado posteriormente.

9. Em relação à alegação de abatimento das parcelas futuras, rejeita-se a tese do apelante. Não se trata de pagamento antecipado da dívida, e sim de vencimento antecipado da dívida por inadimplência (cláusula vigésima terceira), situações diversas. Houve legítima consolidação da propriedade por inadimplência, que, posteriormente, só foi cancelada em razão da substituição da garantia da alienação fiduciária pelo depósito judicial, como deferido pelo Juízo de primeiro grau. Destaque-se que a tutela de urgência não foi deferida, não havendo, assim, impedimento para que a consolidação da propriedade tivesse se realizado.

10. Quanto ao termo final para atualização do débito, a dívida deve ser atualizada até a data efetiva do depósito judicial, que ocorreu em 17/02/2020, como salientado na sentença. Não tem amparo a tese de que a atualização da dívida deveria se dar até a data da audiência realizada em 24/09/2019. Não houve acordo em audiência, apenas foi dado prazo para que as partes conversassem sobre valores e forma de pagamento e informassem ao Juízo o "resultado das tratativas", no caso de haver a conciliação. A CEF foi clara pela negativa do acordo quando defendeu o indeferimento da tutela de urgência requerida após a audiência. Somente após mediação do Juízo de primeiro grau, a CEF anuiu com a substituição da garantia. Assim, o termo final de atualização do débito só pode ser a data do depósito judicial, quando se efetivamente garantiu o credor.

11. No que concerne à tese de não se aplicar as regras do SFH no contrato firmado, deve ser esclarecido que o contrato firmado não está vinculado ao SFH, e sim ao SFI (Sistema de Financiamento Imobiliário), pela garantia de alienação fiduciária de imóvel de propriedade do mutuário dado em garantia da dívida contraída no contrato de mútuo de dinheiro, que atrai a aplicação da Lei nº 9.514/1997.

12. A taxa de ocupação decorre de previsão legal, após a consolidação da propriedade em favor da credora fiduciária, nos termos do art. 37-A da Lei nº 9.514/1997. Não há que se falar em valor similar a de um aluguel, como defendido no apelo, já que deve ser observada a lei. Na hipótese, a taxa de ocupação é devida desde a data de consolidação da propriedade até a data do efetivo depósito judicial,  17/02/2020, quando houve a substituição da garantia. Se não houvesse a substituição da garantia pelo depósito judicial, o termo final seria a data de imissão na posse do imóvel. Contudo, foi cancelada a garantia com o depósito judicial, ante a substituição deferida pelo Juízo de primeiro grau.

13. Apelo conhecido e desprovido.  

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 7a. Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região decidiu, por unanimidade, conhecer da apelação e negar-lhe provimento, majorando a verba honorária fixada em 1% (art. 85, §11, do CPC), nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Rio de Janeiro, 26 de março de 2024.



Documento eletrônico assinado por MARCELLA ARAUJO DA NOVA BRANDAO, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 2ª Região nº 17, de 26 de março de 2018. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc.trf2.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 20001814353v4 e do código CRC ff3fab11.

Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MARCELLA ARAUJO DA NOVA BRANDAO
Data e Hora: 4/4/2024, às 16:55:23

 


 


Documento:20001814351
Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 2ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5001237-67.2018.4.02.5106/RJ

RELATOR: Desembargador Federal JOSÉ ANTONIO LISBÔA NEIVA

APELANTE: RONALD FERNANDO DE CARVALHO BOTELHO JUNIOR (AUTOR)

ADVOGADO(A): LORENA CHIROL MACHADO COSTA (OAB RJ201655)

APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por RONALD FERNANDO DE CARVALHO BOTELHO JÚNIOR, postulando a reforma da sentença constante do evento 91, que julgou improcedente o pedido.

Em seu apelo (evento 120), o autor sustenta que ajuizou ação, objetivando a revisão dos valores cobrados por contrato celebrado com a CEF, bem como a “declaração de nulidade de cláusulas contratuais abusivas, de forma a ser possível a desconstituição das cobranças de juros e multa, readequando o pacto à condição de pessoa em situação de hipervulnerabilidade”; que celebrou com a CEF, em 31/07/2014, contrato de mútuo do valor de R$ 89.000,00, a ser pago em 180 meses, com a primeira parcela no valor de R$ 1.946,24; que a dívida assumida foi garantida com a alienação fiduciária de bem imóvel do apelante, um apartamento avaliado pela CEF em R$ 514.000,00; que cumpriu devidamente com o pagamento das primeiras três parcelas, contudo, a partir de grave problema de saúde, restou totalmente impossibilitado de arcar com as prestações futuras; que, apesar da inadimplência do devedor advinda da impossibilidade de laborar, a credora se manteve inerte por longos cinco anos, sem realizar nenhum ato expropriatório, gerando uma dívida à época da propositura da ação em torno de R$ 140.000,00, referente apenas às parcelas vencidas; que “a ausência de postura ativa por parte da credora se operou em total abuso do direito, uma vez que a CEF se valeu da excessiva garantia prestada pelo devedor, pois o bem imóvel dado em garantia superava em termos de avaliação em cerca de 6 (seis) vezes o valor do contrato de mútuo”; que, agindo com boa-fé, na tentativa de realizar composição com a credora, buscou por todos os meios possíveis contato com os representantes da apelada, restando as tentativas infrutíferas, já que negavam a concessão de qualquer abatimento, estando irredutíveis quanto ao recebimento total dos valores; que, na audiência realizada, a CEF informou sua concordância em realizar acordo com o apelante, porém ficou completamente inerte por meses, tendo “sumido” enquanto o apelante diligenciava por diversos meios “visando conter a escalada vertiginal dos valores”; que diligenciou, por vias próprias, comprador para o imóvel garantidor da dívida, apresentando a promessa de compra e venda no valor de R$ 310.000,00; que não concordou com os cálculos apresentados pela apelada no montante de R$ 217.909,68, por estarem inseridos indevidamente honorários advocatícios (sem que houvesse a propositura de ação de cobrança), juros, correção monetária e multa (sendo que a própria apelada, deixou a dívida crescer exponencialmente por longos cinco anos, sem ajuizar ação de cobrança, colaborando com seu próprio prejuízo), e ainda deixou de proceder o abatimento proporcional das parcelas futuras, em razão do vencimento antecipado; que, em 23/09/2019, a CEF não se opôs à alienação particular do imóvel, o que fez com que a partir deste momento a dívida estivesse garantida pela alienação particular do bem, não havendo, portanto, que se incidir encargos a partir deste fato; que, após a concordância da CEF com a alienação particular do imóvel, houve a quitação do débito por meio do depósito judicial da integralidade da venda do bem, no valor de R$ 310.000,00; que a sentença julgou improcedentes os pedidos e determinou a intimação da CEF para que informasse o valor atualizado do débito, destacando que os valores depositados seriam utilizados para o pagamento integral do débito à CEF, sendo o excedente entregue ao apelante; que, em embargos de declaração, destacou obscuridade no ponto em que determina à CEF trazer aos autos planilha atualizada do débito, sem fixar balizas temporais para tal cálculo; e que os embargos de declaração foram rejeitados, assinalando-se que, “quanto ao termo final da atualização do débito este deve ser a data do depósito judicial, conforme explicito na fundamentação da sentença”.

Prossegue o apelante, afirmando que deve “a extensão dos valores cobrados ser mitigada, em face da inobservância do princípio da Boa-fé objetiva, tendo em vista a não realização dos atos expropriatórios, visto que a Apelada descuidou-se de seu dever de mitigar o prejuízo sofrido, pois o fato de se manter inerte por cerca de 5 (cinco) anos, sem realizar a expropriação do bem dado em garantia, evidencia a ausência de zelo com seu patrimônio e o agravamento significativo das perdas, uma vez que a realização mais célere dos atos expropriatórios diminuiria a extensão do dano”; que, assim, ante a violação ao princípio da boa-fé objetiva, deve ser aplicada a penalidade de exclusão de um ano de ressarcimento da parte credora; que, como a concordância da CEF se deu a título de acordo, em continuação as tratativas iniciadas na audiência de conciliação do evento 21, não é razoável que os débitos sejam corrigidos até a data de depósito dos valores, devendo ser restritos à data do aceite do acordo pela CEF; que a demora para a realização do depósito nestes autos e purgação da mora ocorreu por culpa exclusiva da CEF, uma vez que, desde 20/03/2018 (evento 10), já havia conseguido o acordo com o futuro comprador no valor de R$ 310.000,00 (trezentos e dez mil reais) pela venda do imóvel; que, por ausência de aval da CEF (ocorrido apenas no evento 56 – 23/09/2019 – 1 ano e 6 meses após a proposta) e também pela demora da CEF para a retirada do gravame para possibilitar a transferência do imóvel diretamente ao comprador, o depósito do valor só pode ser feito em 17/02/2020 (evento 71 – COMP 2 – página 1), quase dois anos após ter conseguido comprador para o imóvel; que, assim, os juros e correção monetária ficaram correndo por culpa exclusiva da CEF, não sendo justo ser penalizado por tal fato; que requer, portanto, que seja “fixada como baliza temporal (...) à CEF informar o valor atualizado do débito a data de 23 de setembro de 2019, correspondente ao aceite da CEF com a alienação particular do bem a terceiro em forma de acordo que resguardou a dívida”; que, no curso da lide, além de juros e correção, a CEF inovou ao trazer planilha de débitos incluindo a cobrança de “taxa de ocupação” (evento 44) no montante de R$ 48.498,64, planilha devidamente impugnada no evento 48; que, apesar da previsão legal da cobrança de “taxa de ocupação” constante no art. 37-A da Lei nº 9.514/97, tal cobrança não se coaduna com o caso em questão, porque não se trata de contrato de financiamento imobiliário, tendo a CEF inserido indevidamente no contrato a aplicação das normas próprias do SFH, em total desconformidade com a natureza do contrato em tela; que a CEF não cumpriu com o devido processo legal para a cobrança da referida taxa, já que não foi intimado “em sede de Processo Administrativo sobre a cobrança da referida taxa ou sobre sua necessidade de pagamento”; que a consolidação da propriedade pela CEF só ocorreu em 16/11/2018, após a propositura da presente demanda; que a cobrança da taxa de ocupação foi lançada sem a realização de leilão do bem e sem ter ocorrido a imissão da apelada na posse do imóvel em questão; que a cobrança da taxa de ocupação é indevida, tendo a própria CEF, em contestação, apresentado cálculos sem tal cobrança; que as perdas experimentadas pela instituição financeira já são compensadas pela multa contratual; e que, subsidiariamente, caso o entendimento seja pela legalidade da cobrança da taxa de ocupação, deve ser cobrado o valor mensal de R$ 1.150,00, conforme contrato de locação apresentado, em observância aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade.

Sem contrarrazões da CEF, conforme evento 123.

É  o relatório. Peço dia para julgamento.



Documento eletrônico assinado por MARCELLA ARAUJO DA NOVA BRANDAO, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 2ª Região nº 17, de 26 de março de 2018. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc.trf2.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 20001814351v2 e do código CRC cabf6849.

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