Documento:20000800676
Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 2ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5001647-88.2021.4.02.9999/ES

RELATOR: Desembargadora Federal SIMONE SCHREIBER

APELANTE: IRACI EGGERT GORL

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. AUXÍLIO-RECLUSÃO RURAL. ART. 39 LEI 8.213/91. REQUISITOS PREENCHIDOS.

I - O benefício do auxílio-reclusão é destinado aos dependentes do segurado recolhido à prisão, com previsão para os segurados especiais da Previdência Social, conforme art. 39 da Lei 8.213/1991.

II - Para fazer jus ao benefício, deverá a autora comprovar (i) sua condição de dependente; (ii) a permanência e o efetivo recolhimento à prisão do segurado instituidor; e (iii) a condição de segurado especial do segurado recluso por meio da comprovação do exercício de atividade rural.

III - A autora demonstrou o vínculo de dependência econômica para com seu filho, dado que se trata de caso de atividade rural familiar, que, por definição, a família é a unidade produtiva básica. Assim, de forma diferente do que acontece na cidade, uma vez demonstrada a residência comum e a atividade rural do grupo familiar, é possível admitir, ao menos em um primeiro momento, que todos os indivíduos em idade laboral colaborem ativamente para a manutenção da casa, o que caracteriza a dependência econômica mútua para fins previdenciários.

IV - A ausência de anotação de vínculos urbanos no CNIS do segurado recluso corrobora a tese de que ele tirava seu sustento com a atividade rural familiar. Além disso, há nos autos, notas fiscais em seu nome com endereço do sítio, revelando que residia de fato com seus genitores.

V- Por último, as duas testemunhas ouvidas em audiência confirmaram que o segurado recluso laborava juntamente com os pais na propriedade rural. 

VI - Por todo o exposto, ficou demonstrado o vínculo de dependência entre a autora e o segurado, além do evidente exercício de atividade rural que o caracteriza como segurado especial. A permanência no cárcere também foi demonstrada por meio da apresentação da Certidão de Permanência Carcerária.

VII - Portanto, cumpridos os requisitos exigidos pela legislação, deve ser provida a apelação da autora e concedido o benefício de auxílio-reclusão.

VIII- A correção monetária e os juros de mora para todo o período devem ser calculados de acordo com o Manual de Cálculos da Justiça Federal - Tema 905 do STJ.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 1a. Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região decidiu, por unanimidade, DAR PROVIMENTO à apelação da autora, nos termos da fundamentação. Presentes os requisito legais, CONCEDO a tutela de urgência para determinar ao INSS que institua o benefício, em até dez dias, após a intimação do acórdão, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Rio de Janeiro, 10 de março de 2022.



Documento eletrônico assinado por ROGÉRIO TOBIAS DE CARVALHO, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 2ª Região nº 17, de 26 de março de 2018. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc.trf2.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 20000800676v6 e do código CRC 03d0e276.

Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ROGÉRIO TOBIAS DE CARVALHO
Data e Hora: 23/3/2022, às 13:35:8

 


 


Documento:20000798605
Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 2ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5001647-88.2021.4.02.9999/ES

RELATOR: Desembargadora Federal SIMONE SCHREIBER

APELANTE: IRACI EGGERT GORL

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta por IRACI EGGERT GORL contra sentença que julgou improcedente o pedido de concessão do benefício de auxílio-reclusão rural.

Cuida-se de pedido de concessão de benefício de auxílio-reclusão rural por IRACI EGGERT GORL em face da prisão de seu filho LEANDRO EGGERT GORL em 18.5.2017.

Entendeu o juízo a quo (Evento 1, SENT5) que não há nos autos qualquer indício de provas que seja capaz de demonstrar a dependência da autora para com o filho recluso e que no contrato de parceria agrícola juntado aos autos figuram a autora, o cônjuge e o filho, o que demonstra que todos trabalham em
regime de economia familiar, não sendo exclusiva do filho recluso a mantença da casa. Condenou a autora em custas e honorários advocatícios, contudo ficando suspensa essa obrigação em razão da gratuidade de justiça deferida.

A autora, em sua apelação (Evento 1, APELAÇÃO6), alega que, comprovou a relação de dependência, uma vez que juntou aos autos, entre outros documentos, contrato de parceria agrícola que demonstram que a família trabalha na lavoura em regime de economia familiar. Além disso, destaca que a prova testemunhal foi firme em atestar a existência da dependência econômica.

Contrarrazões do INSS (Evento 1, CONTRAZAP7), pedindo que seja negado o recurso da autora.

Sem manifestação do Ministério Público Federal por ausência de interesse público (Evento 4, PARECER1). 

É o relatório. 

VOTO

Conheço da apelação, eis que presentes seus requisitos de admissibilidade.

Conforme relatado, cuida-se de apelação interposta por IRACI EGGERT GORL contra sentença que julgou improcedente o pedido de concessão do benefício de auxílio-reclusão rural em face da prisão de seu filho LEANDRO EGGERT GORL em 18.5.2017.

O benefício do auxílio-reclusão é destinado aos dependentes do segurado recolhido à prisão. A concessão depende do preenchimento dos requisitos previstos no art. 201, IV, da CF/88 e no art. 80 da Lei nº 8.213/91, in verbis

Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: 

IV - salário-família e auxílio-reclusão para os dependentes dos segurados de baixa renda; 

Art. 80. O auxílio-reclusão será devido, nas mesmas condições da pensão por morte, aos dependentes do segurado recolhido à prisão, que não receber remuneração da empresa nem estiver em gozo de auxílio-doença, de aposentadoria ou de abono de permanência em serviço.  

Parágrafo único. O requerimento do auxílio-reclusão deverá ser instruído com certidão do efetivo recolhimento à prisão, sendo obrigatória, para a manutenção do benefício, a apresentação de declaração de permanência na condição de presidiário. 

Além de devido aos segurados de baixa renda como preceitua o art. 201, IV, da CF/88, o benefício de auxílio-reclusão também é previsto para os segurados especiais da Previdência Social, conforme art. 39 da Lei 8.213/1991.

A definição de segurado especial da Previdência Social encontra-se no inciso VII, do artigo 11, da Lei 8.213/1991, com as alterações da Lei 11.718/2008, verbis:

Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:

(...)

VII – como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de:

a) produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais, que explore atividade:

1. agropecuária em área de até 4 (quatro) módulos fiscais;

2. de seringueiro ou extrativista vegetal que exerça suas atividades nos termos do inciso XII do caput do art. 2o da Lei no 9.985, de 18 de julho de 2000, e faça dessas atividades o principal meio de vida;

b) pescador artesanal ou a este assemelhado que faça da pesca profissão habitual ou principal meio de vida; e

c) cônjuge ou companheiro, bem como filho maior de 16 (dezesseis) anos de idade ou a este equiparado, do segurado de que tratam as alíneas a e b deste inciso, que, comprovadamente, trabalhem com o grupo familiar respectivo.

§ 1º Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes

Art. 39.  Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do caput do art. 11 desta Lei, fica garantida a concessão:

I - de aposentadoria por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de pensão, no valor de 1 (um) salário mínimo, e de auxílio-acidente, conforme disposto no art. 86, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período, imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício requerido; ou                (Redação dada pela Lei nº 12.873, de 2013)

Da leitura dos aludidos artigos, conclui-se que para fazer jus ao benefício, deverá a autora comprovar (i) sua condição de dependente; (ii) a permanência e o efetivo recolhimento à prisão do segurado instituidor; e (iii) a condição de segurado especial do segurado recluso por meio da comprovação do exercício de atividade rural.

Na hipótese dos autos, a autora IRACI EGGERT GORL é mãe do recluso LEANDRO EGGERT GORL e alega que o sustento da família ficou prejudicado desde a sua prisão em 18.5.2017, tendo em vista que o filho ajudava trabalhando na terra em regime de economia familiar.

A autora para comprovar seu direito apresentou: 

(i) Declaração de 2017 firmada por REGINA SCHULTZ afirmando que LEANDRO EGGERT GORL laborava na sua propriedade com os pais parceiros agrícolas meeiros; 

(ii) certidão de casamento entre IRACI EGGERT e DANIEL GORL; 

(iii) certidão de nascimento de LEANDRO EGGERT GORL em que constam IRACI e DANIEL GORL como seus genitores; 

(iv) Cadastro da família pela Secretaria Municipal de Saúde de 21.6.1999 em que constam os genitores como lavradores; 

(v) Contrato de Parceria Agrícola entre outorgante REGINA SCHULTZ e outorgados IRACI, DANIEL e LEANDRO EGGERT GORL de 14.9.2016 de terreno em Córrego do Sossego, Vila Pavão-ES; 

(vi) Notas fiscais de 2015 e 2016 em nome de LEANDRO com endereço do Córrego do Sossego; e

(vii) Certidão de Permanência Carcerária (Evento 1, INIC1).

Entendeu o juízo a quo em sentença que não há nos autos qualquer indício de provas que seja capaz de demonstrar a dependência da autora para com o filho recluso e que no contrato de parceria agrícola juntado aos autos figuram a autora, o cônjuge e o filho, o que demonstra que todos trabalham em regime de economia familiar, não sendo exclusiva do filho recluso a mantença da casa.

A autora, em sua apelação, alega que, comprovou a relação de dependência, uma vez que juntou aos autos, entre outros documentos, contrato de parceria agrícola que demonstram que a família trabalha na lavoura em regime de economia familiar. Além disso, destaca que a prova testemunhal foi firme em atestar a existência da dependência econômica.

Em que pesem os argumentos utilizados pelo juízo de que a mantença da casa não é de exclusiva responsabilidade do filho recluso, entendo que a autora demonstrou o vínculo de dependência econômica para com seu filho, dado que se trata de caso de atividade rural familiar.

Na atividade rural familiar, por definição, a família é a unidade produtiva básica. Assim, de forma diferente do que acontece na cidade, uma vez demonstrada a residência comum e a atividade rural do grupo familiar, é possível admitir, ao menos em um primeiro momento, que todos os indivíduos em idade laboral colaborem ativamente para a manutenção da casa, o que caracteriza a dependência econômica mútua para fins previdenciários.

No caso concreto, além da demonstração de residência no local onde eram desempenhadas as atividades rurais, a ausência de anotação de vínculos urbanos no CNIS do segurado recluso corrobora a tese de que ele tirava seu sustento com a atividade rural familiar. Além disso, há nos autos, notas fiscais em nome de LEANDRO com o endereço do sítio em Córrego do Sossego dos anos de 2015 e 2016.

Por último, as duas testemunhas ouvidas em audiência (Evento 1, ATOORD4) confirmaram que o segurado recluso laborava juntamente com os pais na propriedade rural do Córrego do Sossego. Inclusive, a primeira das testemunhas, Sr. Adilson Lagasse afirmou que conhece a família da autora há 25 anos e que o filho recluso LEANDRO trabalhava somente na lavoura dos genitores.

Por todo o exposto, ficou demonstrado o vínculo de dependência entre a autora e o segurado, além do evidente exercício de atividade rural que o caracteriza como segurado especial. A permanência no cárcere também foi demonstrada por meio da apresentação da Certidão de Permanência Carcerária em Evento 1, INIC1.

Portanto, cumpridos os requisitos exigidos pela legislação, deve ser provida a apelação da autora e concedido o benefício de auxílio-reclusão.

No tocante à aplicação de juros e correção monetária acrescidos sobre os valores em atraso, devem ser calculados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, que já contempla tanto o entendimento do Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 870.947 (Tema 810) quanto do Superior Tribunal de Justiça no julgamento dos REsp 1.495.146/MG, 1.492.221/PR e 1.495.144/RS (Tema 905). 

Adicionalmente, deve ser aplicado o Enunciado 56 da Súmula deste Tribunal Regional da 2ª Região, que dispõe que: “É inconstitucional a expressão ‘haverá incidência uma única vez’”, constante do art. 1°-F da Lei N° 9.494/97, com a redação dado pelo art. 5° da Lei 11.960/2009”. 

Em relação aos honorários recursais e quanto ao percentual da condenação, cuidando-se de sentença proferida após a vigência do Código de Processo Civil de 2015, a fixação dos honorários em que a fazenda pública for parte deve respeitar os parâmetros previstos no art. 85, 3º do CPC. Adicionalmente, conforme posicionamento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, os recursos interpostos contra decisões publicadas a partir do dia 18.03.2016 estarão sujeitos ao possível arbitramento de honorários de sucumbência recursais, previstos no art. 85, § 11 do CPC/2015: 

§ 11. O tribunal, ao julgar recurso, majorará os honorários fixados anteriormente levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º, sendo vedado ao tribunal, no cômputo geral da fixação de honorários devidos ao advogado do vencedor, ultrapassar os respectivos limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º para a fase de conhecimento. 

Todavia, na forma do art. 85, §4°, II, do NCPC, tratando-se de acórdão ilíquido proferido em demanda da qual a Fazenda Pública faça parte, a fixação dos honorários, inclusive recursais, será feita na fase de liquidação, observando-se os critérios estabelecidos no art. 85, §§ 2° e 3°, do mesmo diploma legal. 

Em se tratando de benefício de previdenciário, de natureza alimentar, presume-se o risco de dano irreparável à sobrevivência digna da segurada. Por sua vez, a própria fundamentação deste voto consubstancia o segundo requisito do artigo 300 do NCPC. 

Ante o exposto, voto no sentido de DAR PROVIMENTO à apelação da autora, nos termos da fundamentação. Presentes os requisito legais, CONCEDO a tutela de urgência para determinar ao INSS que institua o benefício, em até dez dias, após a intimação do acórdão.



Documento eletrônico assinado por ROGÉRIO TOBIAS DE CARVALHO, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 2ª Região nº 17, de 26 de março de 2018. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc.trf2.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 20000798605v49 e do código CRC 0ee0b2bc.

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