A egrégia 3ª Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região decidiu, por maioria, negar provimento à apelação interposta pela PETRÓLEO BRASILEIRO S/A - PETROBRAS, nos termos do voto do Relator.
A ementa foi redigida nos seguintes termos (evento 53):
RECURSOS DE APELAÇÃO. IMPOSTO DE RENDA RETIDO NA FONTE SOBRE REMESSAS DE VALORES AO EXTERIOR PARA PAGAMENTO DE AFRETAMENTO, ALUGUEIS OU ARRENDAMENTO DE EMBARCAÇÃO. BENEFÍCIO FISCAL DE ALÍQUOTA ZERO. ART. 1º DA LEI Nº 9.481/1997. ENQUADRAMENTO DE PLATAFORMA MARÍTIMA PETROLÍFERA COMO ESEPÉCIE DE EMBARCAÇÃO. BENEFICIÁRIO DA REMESSA RESIDENTE OU DOMICILIADO EM PAIS COM TRIBUTAÇÃO FAVORECIDA. ART. 8º DA LEI Nº 9.779/1999. VALIDADE DO ATO DECLARATÓRIO SRF Nº 8/1999. EXCLUSÃO DE PENALIDADE, JUROS E ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA DO FATO GERADOR. PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 100 DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL.
1. A Autora propôs esta ação judicial para contestar o auto de infração lavrado pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, por intermédio do qual foi constituído crédito tributário de imposto de renda, em razão de a Demandante não ter procedido à devida retenção na forte do imposto de renda incidente sobre as remessas feitas ao exterior para fins de pagamento por afretamento de plataforma marítima petrolífera, no período de 1999 a 2002. A sentença apelada julgou improcedente a demanda.
2. Em recurso de apelação, a Autora sustenta, inicialmente, a nulidade da sentença apelada com o argumento de que o juízo a quo, ao fazer o controle judicial do auto de infração questionado nesta ação anulatória, teria introduzido fatos e fundamentos jurídicos não expostos pelo auditor fiscal na lavratura do auto de infração e do lançamento, a violar o art. 142 do CTN. Nesse ponto, afirma que a questão relativa à classificação do país de domicílio da pessoa que auferiu a renda, de ser ou não paraíso fiscal, não foi objeto do lançamento fiscal, a indicar uma inovação no julgamento do caso, quando foi aplicada a regra do art. 8º da Lei nº 9.779/1999. Ademais, defende a posição de que o auto de infração deve ser anulado, invocando precedentes jurisprudenciais que adotam o entendimento de que plataforma marítima é espécie de embarcação, a autorizar a concessão do benefício fiscal de alíquota zero disciplinado pelo art. 1º, inc. I, da Lei nº 9.481/1997.
3. A UNIÃO interpôs recurso de apelação apenas para postular pela majoração do valor da condenação da Autora em honorários advocatícios.
4. A sentença não carrega qualquer vício de nulidade, tendo em vista que o auto de infração tem como fundamento, além da questão referente à classificação da plataforma como espécie de embarcação, a situação de que a pessoa que auferiu renda, no Brasil, ser domiciliada em país com tributação favorecida, de modo que foi aplicado, pelo agente fiscal, a regra do art. 8º da Lei nº 9.779/1999.
5. A plataforma marítima é espécie de embarcação, nos termos do art. 2º, V, da Lei nº 9.537/1997. Precedentes citados do TRF-2ª/R: AC 176768, AC 337034, AC 213217, AC 179747, AC 347149.
6. A partir da vigência da Lei nº 9.779/1999, deve incidir a alíquota de 25% sobre as remessas para o exterior, relativamente a qualquer operação, quando o país de destino for consideração com tributação favorecida. No caso, a pessoa jurídica que auferiu a renda, no Brasil, tem domicílio nas Ilhas Cayman, que é classificado como país de tributação favorecida (paraíso fiscal).
7. Não merece qualquer reparo o auto de infração contestado, notadamente quanto à apuração do crédito de imposto de renda retido na forma, sobre as remessas de soma ao exterior, com a aplicação do dispositivo do art. 8º da Lei nº 9.779/1999.
8. O Ato Declaratório SRF nº 8/1999 determinou que o art. 8º da Lei nº 9.779/1999 não seria aplicável às remessas ao exterior decorrentes de contratos de afretamento celebrados até 31/12/1998. Esse ato administrativo (ato infralegal) expedido pela Secretaria da Receita Federal é inservível para estabelecer o aspecto temporal da hipótese de incidência do imposto de renda, de modo que não pode disciplinar a tributação do imposto de renda na fonte. A interpretação dada pelo Secretário da Receita Federal objetivou alterar a disciplina legal do fato gerador do imposto de renda, disposta no art. 43 do Código Tributário Nacional (O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica). O Ato Declaratório nº 08/1999, da Secretaria da Receita Federal, quando determinou que o art. 8º da Lei nº 9.779/1999 não seria aplicável às remessas decorrentes de contratos firmados até 31/12/1998, cometeu duas ilegalidades, a saber: alterou o fato gerador do imposto de renda, substituindo a definição jurídica de disponibilidade de renda por "celebração de contrato", e modificou o aspecto temporal do fato gerador do imposto de renda para uma situação de mera expectativa de direito.
9. A Autora invoca a cláusula do parágrafo único do art. 100 do Código Tributário Nacional para argumentar que, no caso, seria indevida a aplicação das multas e penalidades em razão da não retenção do imposto de renda sobre as remessas dos valores para fins de pagamento pelo afretamento da plataforma marítima móvel petrolífera. Sustenta que o Ato Declaratório da Secretaria da Receita Federal nº 8/1999 expôs a interpretação no sentido de que o art. 8º da Lei nº 9.779/1999 não seria aplicável às remessas decorrentes de contratos celebrados até 31/12/1998. Com efeito, o dispositivo legal estipula que são normas complementares das leis os atos normativos expedidos pelas autoridades administrativas. E que tais atos, quando observados pelo sujeito passivo da obrigação tributária (principal ou assessória) exclui a imposição de penalidade. Portanto, essa disposição legal atrai para a discussão a questão da natureza jurídica dos atos declaratórios de interpretação expedidos pelas autoridades administrativas.
10. A Autora não formalizou, na petição inicial, a necessária cumulação objetiva de pedidos, na modalidade de pedido subsidiário, conforme disciplinado pelo art. 292 do CPC/73. Portanto, a aplicação da cláusula do art. 100 do CTN não foi objeto de pedido no instrumento da demanda. Sobre essa questão não houve debate entre as partes, nem pronunciamento do juízo a quo na sentença. Por isso, a pretensão da incidência do citado dispositivo do Código, em sede de apelação, representa indevida inovação recursal, verdade pela jurisprudência desta Corte Regional. Precedente citado: STJ, AROMS 19.610, Rel. Ministro Jorge MUSSI, DJe de 30/08/2010; TRF-2ª/R. AC 01028078420134025001, Rel. J.F.Convocado Theophilo MIGUEL, e-DJ de 22/07/2016.
11. Na linha do entendimento dominante do Superior Tribunal de Justiça, nas hipóteses previstas no §4º do art. 20 do CPC/73 (§ 4º - Nas causas de pequeno valor, nas de valor inestimável, naquelas em que não houver condenação ou for vencida a Fazenda Pública, e nas execuções, embargadas ou não, os honorários serão fixados consoante apreciação eqüitativa do juiz, atendidas as normas das alíneas a, b e c do parágrafo anterior), a verba honorária deve ser fixada mediante apreciação equitativa do juiz, que não fica adstrito aos percentuais constantes do § 3º do art. 20 do Código. No juízo de equidade, o juiz deve levar em consideração o caso concreto em face das circunstâncias previstas nas alíneas a, b e c do § 3º; podendo, inclusive, adotar, como base de cálculo, o valor da causa, o valor da condenação, ou mesmo arbitrar o valor fixo. Portanto, nem o valor da causa, nem o benefício econômico obtido com a sentença são dados determinantes para a fixação da verba honorária de sucumbência. AgRg no REsp 1.548.098, DJe de 10/05/2017. Nesses termos, os honorários advocatícios fixados na sentença merece tão somente uma simples ajuste, a fim de que seja estabelecia a quantia de R$ 10.000,00.
12. Desprovido o recurso de apelação interposto por PETRÓLEO BRASILEIRO S/A - PETROBRAS, e parcialmente provido o recurso de apelação interposto pela UNIÃO.
Os embargos de declaração foram desprovidos, por unanimidade (evento 81).
Conforme relatado, o egrégio Superior Tribunal de Justiça deu provimento ao Recurso Especial interposto pela PETRÓLEO BRASILEIRO S A PETROBRAS (evento 151, DESPADEC5), para que os Embargos Declaratórios sejam novamente analisados, especialmente no tocante às teses relevantes aduzidas pela recorrente no sentido de que "há isenção prevista no artigo 2° da lei 9.481/97 para contratos firmados antes de 31/12/1996, bem como a tese de que a norma do art. 1º, I, da Lei 9.481/97 seria especial em relação às disposições do art. 8º da Lei 9.779/99, implicando em violação do artigo 2°, § 2° da LINDB".
Passo ao reexame dos embargos de declaração (evento 111 - p. 49-83).
Alega o embargante que o art. 8º da Lei nº 9.779/99 constitui norma geral aplicável a todos os residentes em paraísos fiscais, devendo submeter-se à regra especial (Lei nº 9.481/97 - art.1º, I) que tributa à alíquota zero os rendimentos remetidos para residentes e domiciliados no exterior decorrentes de afretamento de embarcações. Do contrário, haveria violação ao disposto no artigo 2°, § 2° da LINDB, segundo o qual "A lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei anterior".
Sem razão à embargante.
A Lei nº 9.481/97 estabelece normas gerais acerca da incidência de imposto de renda na fonte sobre rendimentos de beneficiários residentes ou domiciliados no exterior. E dispõe em seu artigo 1º, inciso I, o seguinte:
"Art. 1º A alíquota do imposto de renda na fonte incidente sobre os rendimentos auferidos no País, por residentes ou domiciliados no exterior, fica reduzida para zero, nas seguintes hipóteses: (Redação dada pela Lei nº 9.532, de 10.12.97)
I - receitas de fretes, afretamentos, aluguéis ou arrendamentos de embarcações marítimas ou fluviais ou de aeronaves estrangeiras ou motores de aeronaves estrangeiros, feitos por empresas, desde que tenham sido aprovados pelas autoridades competentes, bem como os pagamentos de aluguel de contêineres, sobrestadia e outros relativos ao uso de serviços de instalações portuárias;"
Por sua vez, a Lei nº 9.779/99 trouxe alterações na legislação do Imposto de Renda no tocante à incidência sobre rendimentos de beneficiários no exterior, estabelendo em seu artigo 8º o seguinte:
Art. 8o Ressalvadas as hipóteses a que se referem os incisos V, VIII, IX, X e XI do art. 1o da Lei no 9.481, de 1997, os rendimentos decorrentes de qualquer operação, em que o beneficiário seja residente ou domiciliado em país que não tribute a renda ou que a tribute à alíquota máxima inferior a vinte por cento, a que se refere o art. 24 da Lei no 9.430, de 27 de dezembro de 1996, sujeitam-se à incidência do imposto de renda na fonte à alíquota de vinte e cinco por cento.
Como se vê, o artigo 8º, norma especial, afastou implicitamente a incidência do artigo 1º, inciso I da Lei nº 9.481/97 sobre as hipóteses de rendimentos no exterior em que o beneficiário seja residente ou domiciliado em país que não tribute a renda ou que a tribute à alíquota máxima inferior a vinte por cento, determinando que, em tais casos, a alíquota será de vinte e cinco por cento.
Nesse panorama, não cabe ao intérprete estender benefício fiscal (alíquota zero) à hipótese não alcançada pela norma legal. Não pode o Judiciário atuar como substituto do legislador, considerando que no caso, inclusive, sequer há omissão legislativa. Pelo contrário, a nova lei apresentou expressamente as hipóteses da não incidência da alíquota de 25% (incisos V, VIII, IX, X e XI do art. 1o da Lei no 9.481, de 1997), deixando de incluir dentre estas a hipótese dos autos.
Além disso, constou expressamente no voto condutor do acórdão embargado o seguinte (com meus destaques):
"[...] Portanto, no caso em análise, a Autora somente poderia alcançar a vitória nesta disputa judicial se demonstrasse: (a) que plataforma marítima é embarcação, e (b) que a pessoa jurídica que auferiu a renda, no Brasil, estiver domiciliada em país não considerado paraíso fiscal ou com tributação favorecida.
Conforme acima exposto, plataforma marítima petrolífera é embarcação, para os fins do art. 1º da Lei nº 9.481/1997.
Nada obstante, in casu, o benefício fiscal de alíquota zero do imposto de renda mostra-se vedado, porque o beneficiário das remessas de valores é domiciliado em Cayman, conhecido país de tributação favorecida, a exigir a incidência da regra contida no art. 8º da Lei nº 9.779/1999, que determina, nesses específicos casos, a incidência da alíquota de 25%. [...]"
Do mesmo modo, não prospera o argumento segundo o qual a Lei nº 9.481/97, ao prever a alíquota zero de IRRF nas remessas de renda ao exterior, manteve, em seu artigo 2°, o regime anterior de isenção para contratos firmados antes de 31/12/1996, devendo tal dispositivo ser aplicado na hipótese dos autos, em que os contratos foram celebrados na vigência da lei anterior. Isso porque, conforme esclarecido no voto condutor do acórdão embargado, considera-se ocorrido o fato gerador, quando se trata de remessa de renda ao exterior, no momento da própria remessa (art. 33 e art. 36 da Lei nº 7.713/1988).
Para fins de aspecto temporal da ocorrência do fato gerador do imposto de renda, considera-se o momento da disponibilidade de renda, a qual, na hipótese dos autos, ocorre com a efetiva remessa da renda ao exterior e não com a celebração de contrato. Por essa razão, não se aplica o art. 2º da Lei nº 9.481/97 ao caso.
Conclusão
Portanto, diante da inexistência de fundamentos que justifiquem a reforma do acórdão embargado, devem ser providos os aclaratórios apenas para sanar as omissões apotadas, sem efeitos infringentes.
Ante o exposto, voto no sentido de DAR PROVIMENTO aos embargos de declaração, para suprir omissão, sem efeitos modificativos, nos termos da fundamentação.