I – A caracterização da especialidade do tempo de labor do segurado deve ser considerada de acordo com legislação vigente à época do exercício da atividade.
II - O tempo de serviço prestado até o início da vigência da Lei nº 9.032-1995 pode ser considerado especial com base apenas no rol previsto nos anexos dos atos normativos regulamentadores da legislação previdenciária, mormente os do Decreto nº 53.831-1964 e do Decreto nº 83.080-1979, os quais nominavam as atividades tidas como prejudiciais à saúde e à integridade física do segurado consoante a exposição a determinados os agentes químicos, físicos e biológicos (itens 1.1.1 a 1.3.2 do anexo do Decreto nº 53.831-1964 e anexo I do Decreto nº 83.080-1979), bem como aquelas que, de acordo com a categoria profissional, deveriam ser classificadas, por presunção legal, como insalubres, penosas ou perigosas (itens 2.1.1 a 2.5.7 do anexo do Decreto nº 53.831-1964 e anexo II do Decreto nº 83.080-1979).
III - O não enquadramento da atividade exercida pelo segurado em uma das consideradas presumidamente especiais pelos decretos regulamentadores segundo o grupo profissional (itens 2.1.1 a 2.5.7 do anexo do Decreto nº 53.831-1964 e anexo II do Decreto nº 83.080-1979) não impede, per si, a caracterização da especialidade do seu tempo de serviço, trabalhado até o advento da Lei nº 9.032-1995, acaso fique efetivamente comprovado através de perícia ou documento idôneo a sua insalubridade, periculosidade ou penosidade.
IV - Para que tenha classificado como especial o tempo de serviço exercido entre o início da vigência da Lei nº 9.032-95 e o advento da regulamentação da Lei nº 9.528-97 operada pelo Decreto nº 2.172-1997, o segurado deve comprovar a efetiva exposição a agentes nocivos à saúde e à integridade física por meio de formulário apropriado preenchido pelo seu empregador (SB-40, DSS 8030 e DIRBEN 8030), sendo dispensável, contudo, que tais documentos sejam baseados, necessariamente, em laudo técnico.
V - O trabalho exercido a partir da regulamentação da Lei nº 9.528-1997 realizada pelo Decreto nº 2.172-1997, apenas pode ser caracterizado como especial se comprovada a efetiva exposição a agente prejudicial à saúde e à integridade física por meio de laudo técnico emitido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.
VI – A atividade do vigilante era prevista como presumidamente especial até a edição da Lei 9.032-1995, dado o enquadramento como guarda no código 2.5.7 do quadro anexo ao Decreto 53.831-1964.
VII - Após a Lei 9.032-1995, a atividade de vigilante poderá ser admitida como especial mediante prova de eventual exposição a agente insalubre em nível acima do permitido pela legislação como tolerável ou demonstração de que a atividade exercida apresentava risco à integridade física do segurado, conforme entendimento fixado sobre a matéria pela Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, que, ao julgar os processos nº REsp 1830508-RS, REsp 1831377-PR e REsp 1831371-SP, representativos da controvérsia consubstanciada no Tema 1031, nos quais foi fixada a tese de que “É admissível o reconhecimento da especialidade da atividade de Vigilante, com ou sem o uso de arma de fogo, em data posterior à Lei 9.032/1995 e ao Decreto 2.172/1997, desde que haja a comprovação da efetiva nocividade da atividade, por qualquer meio de prova até 5.3.1997, momento em que se passa a exigir apresentação de laudo técnico ou elemento material equivalente, para comprovar a permanente, não ocasional nem intermitente, exposição à atividade nociva, que coloque em risco a integridade física do Segurado”.
VIII - Nossa Corte Suprema, ao julgar o mérito do Recurso Extraordinário nº 870947 (Tema nº 810) na data de 20.09.2017, fixou tão somente a tese da inconstitucionalidade do artigo 1º-F da Lei nº 9.494-1997 na parte em que trata da correção monetária, sem pronunciar, em sede de repercussão geral, qualquer índice em substituição. Por decorrência lógica dessa constatação, deve prevalecer o índice de atualização monetária estabelecido pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Recurso Especial 1495146 (Tema nº 905, julgamento em 20.02.2018), para as condenações de natureza previdenciária, qual seja, o INPC.
Acerca da questão discutida nos autos, impende observar, inicialmente, que a aposentadoria especial já era prevista desde a Lei nº 3.807-60, reconhecida aos trabalhadores que laboravam submetidos a certo grau de risco ou comprometimento da saúde ou da integridade física, beneficiando-os com o cômputo reduzido do seu tempo de serviço (quinze, vinte ou vinte e cinco anos de atividade). Nesse sentido, o artigo 31 da mencionada Lei n.º 3.807-60 expressamente estabelecia que “a aposentadoria especial será concedida ao segurado que, contando no mínimo 50 (cinqüenta) anos de idade e 15 (quinze) anos de contribuições tenha trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos pelo menos, conforme a atividade profissional, em serviços, que, para esse efeito, forem considerados penosos, insalubres ou perigosos, por Decreto do Poder Executivo”.
Com objetivo de regulamentar o referido dispositivo legal, sobreveio primeiramente o Decreto n.º 53.831-64, que estabeleceu a relação das atividades profissionais consideradas especiais consoante a exposição a determinados os agentes químicos, físicos e biológicos (itens 1.1.1 a 1.3.2 do anexo), bem como estabeleceu o rol de serviços e atividades profissionais que, presumidamente, deveriam ser classificadas como insalubres, penosas ou perigosas (itens 2.1.1 a 2.5.7 do anexo). Em momento posterior, foi editado o Decreto n.º 63.230, de 10 de setembro de 1968, que veio a imprimir algumas modificações no elenco das atividades consideradas como especiais naquele primeiro ato normativo. Contudo, o artigo 1.º da Lei n.º 5.527, de 8 de novembro de 1968, ressalvou, até 22 de maio de 1968, o direito adquirido à aposentadoria especial das categorias profissionais que foram excluídas do benefício por força da nova regulamentação aprovada pelo mencionado Decreto n.º 63.230-68.
Os demais decretos que regulamentaram o tema, mantiveram a sistemática de enumeração de atividades que fariam jus à aposentadoria especial conforme os agentes nocivos e também segundo o grupo profissional (artigo 71 e anexos I e II do Decreto n.º 72.771, de 6 de Setembro de 1973; artigo 61 e anexos I e II do Decreto n.º 83.080, de 24 de Janeiro de 1979). Posteriormente, a Lei n.º 6.887, de 10 de dezembro de 1980 (artigo 2.º), veio a prever expressamente a possibilidade de conversão do lapso de atividade exercida em condições especiais para período de trabalho comum com objetivo de integrar a contagem destinada a aposentadoria por tempo de serviço (“O tempo de serviço exercido alternadamente em atividades comuns e em atividades que, na vigência desta Lei, sejam ou venham a ser consideradas penosas, insalubres ou perigosas, será somado, após a respectiva conversão, segundo critérios de equivalência a serem fixados pelo Ministério da Previdência Social, para efeito de aposentadoria de qualquer espécie").
Com o advento da nova ordem constitucional, a Carta de 1988 também privilegiou o benefício previdenciário em apreço, ao assegurar a aposentadoria “após trinta e cinco anos de trabalho, ao homem, e, após trinta, à mulher, ou em tempo inferior, se sujeitos a trabalho sob condições especiais, que prejudiquem a saúde ou a integridade física, definidas em lei” (inciso II do artigo 202 da Constituição, em sua redação original).
Ao instituir o novo Plano de Benefícios da Previdência Social, a Lei n.º 8.213-91, de 24 de julho de 1991, não imprimiu, a princípio, qualquer modificação no regime da concessão da aposentadoria especial, bem como nos critérios do reconhecimento da especialidade de tempo de serviço vigentes até aquela data, sendo estabelecido na redação original do seu artigo 57 que “a aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta lei, ao segurado que tiver trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física”, bem como foi salientado expressamente no § 3.º do mesmo artigo que “o tempo de serviço exercido alternadamente em atividade comum e em atividade profissional sob condições especiais que sejam ou venham a ser consideradas prejudiciais à saúde ou à integridade física será somado, após a respectiva conversão, segundo critérios de equivalência estabelecidos pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social, para efeito de qualquer benefício”. Inclusive, a regulamentação da Lei n.º 8.213-91 realizada pelo Decreto n.º 357, de 7 de dezembro de 1991, no que diz respeito às atividades que fariam jus à aposentadoria por especial, remetia expressamente aos anexos do Decreto nº 53.831-64 e do Decreto nº 83.080-79 (“Art. 295. Para efeito de concessão das aposentadorias especiais serão considerados os Anexos I e II do Regulamento dos Benefícios da Previdência Social, aprovado pelo Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março de 1964, até que seja promulgada a lei que disporá sobre as atividades prejudiciais à saúde e à integridade física”). No ato normativo que o sucedeu, Decreto n.º 611, de 21 de julho de 1992, a determinação foi reiterada no seu respectivo artigo 292.
Diante da edição da Lei n.º 9.032, de 28 de abril de 1995, no entanto, foram realizadas alterações profundas nos critérios de concessão da aposentadoria especial como também do reconhecimento da especialidade do tempo de serviço, imprimindo a seguinte redação ao caput e parágrafos do artigo 57 da Lei n.º 8.213-91:
Art. 57. A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei.
§ 1º A aposentadoria especial, observado o disposto no art. 33 desta lei, consistirá numa renda mensal equivalente a 100% (cem por cento) do salário-de-benefício.
..........................................................................
§ 3º A concessão da aposentadoria especial dependerá de comprovação pelo segurado, perante o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), do tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante o período mínimo fixado.
§ 4º O segurado deverá comprovar, além do tempo de trabalho, exposição aos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, pelo período equivalente ao exigido para a concessão do benefício.
§ 5º O tempo de trabalho exercido sob condições especiais que sejam ou venham a ser consideradas prejudiciais à saúde ou à integridade física será somado, após a respectiva conversão ao tempo de trabalho exercido em atividade comum, segundo critérios estabelecidos pelo Ministério da Previdência e Assistência Social, para efeito de concessão de qualquer benefício.
§ 6º É vedado ao segurado aposentado, nos termos deste artigo, continuar no exercício de atividade ou operações que o sujeitem aos agentes nocivos constantes da relação referida no art. 58 desta lei.
Consoante se depreende das modificações, ficou vedada a concessão de aposentadoria especial fundada apenas no critério da categoria profissional a que pertencia o segurado, passando a ser imprescindível a efetiva comprovação da exposição a agentes nocivos químicos, físicos e biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física. Além disso, ficou expressamente estabelecido na lei que, para que seja considerado especial o exercício da atividade profissional, a comprovação deve evidenciar que o trabalho possua caráter permanente, não ocasional ou intermitente, de modo a prejudicar a saúde ou a integridade física do segurado. Nesse aspecto, convém lembrar que, até essa modificação legislativa, o caráter habitual e permanente da exposição a agentes nocivos já era exigido claramente nos mencionados decretos regulamentadores (artigo 3.º do Decreto 53.831-64 e item “a” do § 1.º do artigo 60 do Decreto n.º 83.080-79).
Pouco tempo depois, sobreveio nova modificação quanto ao regime do benefício em questão, com a edição da Medida Provisória n.º 1.523, de 11 de outubro de 1996, convolada posteriormente na Lei n.º 9.528, de 10 de dezembro de 1997, que deu a seguinte redação ao artigo 58 da Lei n.º 8.213-91:
"Art. 58. A relação dos agentes nocivos químicos, físicos e biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física considerados para fins de concessão da aposentadoria especial de que trata o artigo anterior será definida pelo Poder Executivo.
§ 1° A comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita mediante formulário, na forma estabelecida pelo Instituto Nacional do Seguro Social — INSS, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.
§ 2° Do laudo técnico referido no parágrafo anterior deverão constar informação sobre a existência de tecnologia de proteção coletiva que diminua a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância e recomendação sobre a sua adoção pelo estabelecimento respectivo.
§ 3° A empresa que não mantiver laudo técnico atualizado com referência aos agentes nocivos existentes no ambiente de trabalho de seus trabalhadores ou que emitir documento de comprovação de efetiva exposição em desacordo com o respectivo laudo estará sujeita à penalidade prevista no art. 133 desta Lei.
§ 4º A empresa deverá elaborar e manter atualizado perfil profissiográfico abrangendo as atividades desenvolvidas pelo trabalhador e fornecer a este, quando da rescisão do contrato de trabalho, cópia autêntica desse documento."
A regulamentação que sobreveio a essas modificações, por meio de Decreto n.º 2.172, de 5 de março de 1997, afastou efetivamente a aplicabilidade do elenco das atividades e categorias profissionais antes consideradas especiais nos anexos do Decreto n.º 53.831-64 e Decreto n.º 83.030-79. Passou vigorar, para fins de deferimento da aposentadoria especial a relação dos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física prevista no anexo VI do ato normativo (artigo 66 do Decreto n.º 2.172-97).
No que se refere à comprovação da exposição a agentes nocivos, que passou a ser exigida com o advento das Leis nº 9.032-95 e 9.528-97, para fins de deferimento de aposentadoria especial ou para o reconhecimento da especialidade do período trabalhado com sua conversão para o deferimento da aposentadoria por tempo de serviço, a Juíza Federal da 4.ª Região Marina Vasques Duarte clarifica:
“Pelo que se depreende da leitura desses dispositivos, a nova lei passou a exigir a comprovação da efetiva exposição aos agentes nocivos para configuração do desempenho de atividade especial. Pertencer a certa categoria, cargo ou função, não define mais a priori o direito ao benefício. Cada um dos trabalhadores deve fazer a prova da exposição conclusiva ao risco.
Mas, essa prova podia ser apenas pelo formulário preenchido pela empresa (SB-40), pois a lei não fazia qualquer menção a laudo técnico, à exceção do ruído. Ademais, essas informações prestadas no SB 40, DSS 8030 ou DIRBEN 8030 têm presunção de veracidade, até prova em contrário, sujeitando a empresa e aquele que assina o documento a penalidades administrativas e penais.
Portanto, quanto à comprovação desta exposição, até o Decreto 2.172, de 05.03.97 era feita por formulário preenchido pela empresa, chamado SB 40 (DSS 8030, DIRBEN 8030, hoje substituído pelo perfil profissiográfico previdenciário, conforme explicação abaixo), onde o empregador descrevia detalhadamente todas as atividades do empregado. Não era imposto que este documento fosse preenchido com base em laudo pericial, à exceção de exposição a agentes que exigissem medição técnica, como o ruído. Em 14.10.96, foi publicada a MP 1.523.96 que acrescentou o seguinte parágrafo ao artigo 58, vindo a exigir que o formulário preenchido pela empresa feito com base em laudo técnico, nos seguintes termos:
(omissis)
Assim, a partir dessa Medida Provisória, que foi convalidada pela Lei 9.528.97, em especial desde o Decreto 2.172, de 05.03.97, que regulamentou a MP em questão, além de o segurado ter de provar a efetiva exposição a agente nocivo, deverá fazê-lo com base em laudo técnico.”
(Direito Previdenciário, Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2007. p. 215-216 – grifos aditados)
Convém salientar, nesse aspecto, que a ausência de enquadramento em determinada categoria profissional em período laborado sob a égide do Decreto n.º 53.831-64 e Decreto n.º 83.030-79, não impede, por completo, a caracterização da especialidade do tempo de serviço. É que não tem natureza taxativa o rol das atividades apontadas nos anexos daqueles atos normativos como presumidamente insalubres, perigosas ou insalubres. Na ausência de menção à atividade profissional do segurado que pleiteia o reconhecimento do seu trabalho como especial, impõe-se a comprovação de que foi exposto de maneira habitual e permanente a agentes nocivos que comprometeriam a sua saúde e sua integridade física. A corroborar o acerto de tal ilação, consolidou-se no Enunciado n.º 198 da Súmula do Extinto Tribunal Federal de Recursos a orientação de que "Atendidos os demais requisitos, é devida a aposentadoria especial, se perícia judicial constata que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita em Regulamento". Seguindo essa mesma linha de entendimento, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu que “a ausência do enquadramento da atividade desempenhada pelo segurado como atividade especial não inviabiliza a sua consideração para fins de concessão de aposentadoria”, pois “o fato das atividades enquadradas serem consideradas especiais por presunção legal, não impede, por óbvio, que outras atividades, não enquadradas, sejam reconhecidas como insalubres, perigosas ou penosas por meio de comprovação pericial” (STJ – Sexta Turma – Agravo Regimental no RESP n.º 842325 – Processo 200600869519 – Relator Ministro Hamilton Carvalhido – Julgamento Unânime em 21.09.2006 – DJ de 05.02.2007; e, no mesmo sentido: STJ – Quinta Turma – RESP 639066 – Processo 200400218443 – Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima – Julgamento 20.09.2005 – DJ de 07.11.2005 – p. 345).
Por fim, era entendimento que a partir da Lei n.º 9.711, de 20 de novembro de 1998, – resultante da conversão da Medida Provisória n.º 1.663-10, de 28 de maio de 1998 – havia sido revogado tacitamente o parágrafo 5.º do artigo 57 da Lei n.º 8.213-91, que previa a possibilidade de comutar o lapso de atividade exercida em condições especiais para período de trabalho comum com objetivo de integrar a contagem destinada a aposentadoria por tempo de serviço, determinando em seu artigo 28 que “O Poder Executivo estabelecerá critérios para a conversão do tempo de trabalho exercido até 28 de maio de 1998, sob condições especiais que sejam prejudiciais à saúde ou à integridade física, nos termos dos arts. 57 e 58 da Lei no 8.213, de 1991, na redação dada pelas Leis nos 9.032, de 28 de abril de 1995, e 9.528, de 10 de dezembro de 1997, e de seu regulamento, em tempo de trabalho exercido em atividade comum, desde que o segurado tenha implementado percentual do tempo necessário para a obtenção da respectiva aposentadoria especial, conforme estabelecido em regulamento”. Desse modo, a partir de 28 de maio de 1998 entendia-se vedada a conversão do lapso laborado sob condições especiais em tempo comum, sem prejuízo do direito adquirido ao reconhecimento da especialidade dos períodos anteriores a essa data. Nesse sentido, pronunciava-se o Superior Tribunal de Justiça firmando que a possibilidade de conversão do tempo de serviço especial em comum estava limitada ao labor exercido até 28 de maio de 1998. De outro lado, no âmbito dos Juizados Especiais, a Turma de Uniformização Nacional dos Juizados Especiais Federais consagrava no Enunciado n.º 16 de sua Súmula o entendimento de que “A conversão, em tempo de serviço comum, do período trabalhado em condições especiais somente é possível relativamente à atividade exercida até 28 de maio de 1998 (art. 28 da Lei 9.711.98)”.
Entretanto, em mesma época foi promulgada a Emenda Constitucional n.º 20, de 15 de dezembro de 1998, que, conferindo novo tratamento constitucional aos benefícios da Previdência Social, deu nova redação ao artigo 201 da Constituição da República, passando a estabelecer no respectivo § 1.º o seguinte: “É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos beneficiários do regime geral de previdência social, ressalvados os casos de atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, definidos em lei complementar”. Importa lembrar que a lei complementar que regulamentaria a aposentadoria especial nos termos desse parágrafo, ainda não foi editada, razão porque, até que isso ocorra, ainda vigoram as disposições dos artigos 57 e 58 da Lei n.º 8.213-91 a respeito do benefício (artigo 15 da Emenda Constitucional n.º 20-1998).
Atualmente, o Superior Tribunal de Justiça vem firmando o entendimento de que o trabalhador que tenha exercido atividades em condições especiais, mesmo que depois de 28.05.98, tem direito à conversão do tempo de serviço especial em comum. Nesse sentido e em reforço ao novo entendimento, em 27.03.2009, houve a revogação do mencionado Enunciado n.º 16 da Súmula da Turma de Uniformização Nacional dos Juizados Especiais Federais que proibia expressamente a conversão. Ressalta-se que o próprio INSS, no art. 70, § 2º do Regulamento da Previdência Social (com redação dada pelo Decreto 4827-2003) passou a aceitar a conversão para tempo comum do tempo trabalhado em condições especiais em qualquer período.
Consoante orientação consolidada na jurisprudência pátria, o tempo de serviço é regido pela lei vigente à época em que foi efetivamente prestado e passa a integrar, como direito autônomo, o patrimônio jurídico do trabalhador. Assim, a lei nova que venha a estabelecer restrição ao cômputo do tempo de serviço ou que limite o reconhecimento do seu caráter especial não pode incidir retroativamente, em razão da intangibilidade do direito adquirido. A esse respeito, vale remeter ao que vem reiteradamente decidindo o Colendo Superior Tribunal de Justiça: “O segurado que presta serviço em condições especiais, nos termos da legislação então vigente, e que teria direito por isso à aposentadoria especial, faz jus ao cômputo do tempo nos moldes previstos à época em que realizada a atividade” (STJ – Quinta Turma – Agravo Regimental no RESP n.º 852780 – Processo 200601325090 – Relator Ministro Felix Fischer – Julgamento Unânime em 05.10.2006 – DJ de 30.10.2006; e, em igual direção: STJ – Quinta Turma – Agravo Regimental no RESP n.º 799771 – Processo 200501953130 – Relatora Ministra Laurita Vaz – Julgamento Unânime em 28.02.2008 – DJ de 07.04.2008; STJ – Quinta Turma – RESP 584691 – Processo 200301577576 – Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima – Julgamento Unânime em 05.12.2006 – DJ de 05.02.2007).
Diante do escorço legislativo traçado acerca da legislação referente ao tema e com base nas considerações tecidas até o momento, pode-se traçar as seguintes diretrizes para apreciação da questão discutida nos autos:
1) a caracterização da especialidade do tempo de labor do segurado trabalho deve ser considerada de acordo com legislação vigente à época do exercício da atividade;
2) o tempo de serviço prestado até o início da vigência da Lei nº 9.032-95 pode ser considerado especial com base apenas no rol previsto nos anexos dos atos normativos regulamentadores da legislação previdenciária, mormente os do Decreto nº 53.831-64 e do Decreto nº 83.080-79, os quais nominavam as atividades tidas como prejudiciais à saúde e à integridade física do segurado consoante a exposição a determinados os agentes químicos, físicos e biológicos (itens 1.1.1 a 1.3.2 do anexo do Decreto nº 53.831-64 e anexo I do Decreto nº 83.080-79), bem como aquelas que, de acordo com a categoria profissional, deveriam ser classificadas, por presunção legal, como insalubres, penosas ou perigosas (itens 2.1.1 a 2.5.7 do anexo do Decreto nº 53.831-64 e anexo II do Decreto nº 83.080-79);
3) o não enquadramento da atividade exercida pelo segurado em uma das consideradas presumidamente especiais pelos decretos regulamentadores segundo a grupo profissional (itens 2.1.1 a 2.5.7 do anexo do Decreto nº 53.831-64 e anexo II do Decreto nº 83.080-79) não impede, per si, a caracterização da especialidade do seu tempo de serviço, exercido até o advento da Lei nº 9.032-95, acaso fique comprovado através de perícia ou documento idôneo sua insalubridade, periculosidade ou penosidade;
4) para que tenha classificado como especial o tempo de serviço exercido entre o início da vigência da Lei nº 9.032-95 e o advento da regulamentação da Lei nº 9.528-97 operada pelo Decreto nº 2.172-97, o segurado deve comprovar a efetiva exposição a agentes nocivos à saúde e à integridade física por meio de formulário apropriado preenchido pelo seu empregador (SB-40, DSS 8030 e DIRBEN 8030), sendo dispensável, contudo, que tais documentos sejam baseados, necessariamente, em laudo técnico;
5) O trabalho exercido a partir da regulamentação da Lei nº 9.528-97 realizada pelo Decreto nº 2.172-97, apenas pode ser caracterizado como especial se comprovada a efetiva exposição agente prejudicial à saúde e à integridade física por meio de laudo técnico emitido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho;
6) Consoante atual entendimento do Colendo Superior Tribunal de Justiça, é possível a comutação do tempo comum do labor exercido em condições especiais após 28 de maio de 1998.
Com relação ao EPI, inicialmente, o entendimento comumente adotado nos tribunais quanto ao fornecimento de Equipamento de Proteção Individual – EPI ou Equipamento de Proteção Coletiva – EPC, com intuito de neutralizar ou atenuar os efeitos nocivos dos agentes a que está submetido o trabalhador, era o de que não afastavam, por si sós, a caracterização da especialidade do tempo de serviço. A esse respeito já afirmou o Colendo Superior Tribunal de Justiça que “o fato de a empresa fornecer ao empregado o Equipamento de Proteção Individual – EPI, ainda que tal equipamento seja devidamente utilizado, não afasta, de per se, o direito ao benefício da aposentadoria com a contagem de tempo especial, devendo cada caso ser apreciado em suas particularidades” (STJ – Quinta Turma – RESP 720082 – Processo 20050014238-0 – Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima – Julgamento Unânime em 15.12.2005 – DJ de 10.04.2006 – p. 279). Em mesma direção, esta Corte Regional firmava a orientação de que “O uso de equipamentos de proteção não descaracteriza a situação de agressividade ou nocividade à saúde ou à integridade física, no ambiente do trabalho, principalmente quando não há provas cabais de que sua efetiva utilização tenha neutralizado por completo a ação deletéria dos agentes ambientais nocivos” (TRF da 2ª Região – Primeira Turma Especializada - Apelação em Mandado de Segurança 69692 – Processo 200751040004173 – Relatora Desembargador Maria Helena Cisne – Julgamento Unânime em 27.05.2008 – DJ de 13.06.2008 – p. 485; e, no mesmo sentido: TRF da 2ª Região – Segunda Turma Especializada – Agravo Interno em Apelação Cível nº 277340 – Processo 200102010470177 – Relator Desembargador Messod Azulay Neto – Julgamento Unânime em 20.08.2008 – DJ de 01.09.2008 – p. 449; TRF da 2ª Região – Segunda Turma Especializada – Agravo Interno em Apelação Cível nº 277340 – Relatora Juíza em Convocação Sandra Chalu Barbosa – Julgamento Unânime em 20.08.2008 – DJ de 01.09.2008 – p. 449).
Contudo, o Plenário do Supremo Tribunal Federal lançou novas luzes sobre o tema no julgamento do Recurso Extraordinário com Agravo ARE 664.335 - SC, de relatoria do Ministro Luiz Fux, DJe 12.02.2015, com reconhecimento de repercussão geral:
“RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. DIREITO CONSTITUCIONAL PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. ART. 201, § 1º, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. REQUISITOS DE CARACTERIZAÇÃO. TEMPO DE SERVIÇO PRESTADO SOB CONDIÇÕES NOCIVAS. FORNECIMENTO DE EQUIPAMENTO DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL - EPI. TEMA COM REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA PELO PLENÁRIO VIRTUAL. EFETIVA EXPOSIÇÃO A AGENTES NOCIVOS À SAÚDE. NEUTRALIZAÇÃO DA RELAÇÃO NOCIVA ENTRE O AGENTE INSALUBRE E O TRABALHADOR. COMPROVAÇÃO NO PERFIL
PROFISSIOGRÁFICO PREVIDENCIÁRIO PPP OU SIMILAR. NÃO CARACTERIZAÇÃO DOS PRESSUPOSTOS HÁBEIS À CONCESSÃO E APOSENTADORIA ESPECIAL. CASO CONCRETO. AGENTE NOCIVO RUÍDO. UTILIZAÇÃO DE EPI. EFICÁCIA. REDUÇÃO DA NOCIVIDADE. CENÁRIO ATUAL. IMPOSSIBILIDADE DE NEUTRALIZAÇÃO. NÃO DESCARACTERIZAÇÃO DAS CONDIÇÕES PREJUDICIAIS. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DEVIDO. AGRAVO CONHECIDO PARA NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO EXTRAORDINÁRIO.
1. Conduz à admissibilidade do Recurso Extraordinário a densidade constitucional, no aresto recorrido, do direito fundamental à previdência social (art. 201, CRFB/88), com reflexos mediatos nos cânones constitucionais do direito à vida (art. 5º, caput, CRFB/88), à saúde (arts. 3º, 5º e 196, CRFB/88), à dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CRFB/88) e ao meio ambiente de trabalho equilibrado (arts. 193 e 225, CRFB/88).
2. A eliminação das atividades laborais nocivas deve ser a meta maior da Sociedade - Estado, empresariado, trabalhadores e representantes sindicais -, que devem voltar-se incessantemente para com a defesa da saúde dos trabalhadores, como enuncia a Constituição da República, ao erigir como pilares do Estado Democrático de Direito a dignidade humana (art. 1º, III, CRFB/88), a valorização social do trabalho, a preservação da vida e da saúde (art. 3º, 5º, e 196, CRFB/88), e o meio ambiente de trabalho equilibrado (art. 193, e 225, CRFB/88).
3. A aposentadoria especial prevista no artigo 201, § 1º, da Constituição da República, significa que poderão ser adotados, para concessão de aposentadorias aos beneficiários do regime geral de previdência social, requisitos e critérios diferenciados nos “casos de atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, e quando se tratar de segurados portadores de deficiência, nos termos definidos em lei complementar”.
4. A aposentadoria especial possui nítido caráter preventivo e impõe-se para aqueles trabalhadores que laboram expostos a agentes prejudiciais à saúde e a fortiori possuem um desgaste naturalmente maior, por que não se lhes pode exigir o cumprimento do mesmo tempo de contribuição que aqueles empregados que não se encontram expostos a nenhum agente nocivo.
5. A norma inscrita no art. 195, § 5º, CRFB/88, veda a criação, majoração ou extensão de benefício sem a correspondente fonte de custeio, disposição dirigida ao legislador ordinário, sendo inexigível quando se tratar de benefício criado diretamente pela Constituição. Deveras, o direito à aposentadoria especial foi outorgado aos seus destinatários por norma constitucional (em sua origem o art. 202, e atualmente o art. 201, § 1º, CRFB/88). Precedentes: RE 151.106 AgR/SP, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 28/09/1993, Primeira Turma, DJ de 26/11/93; RE 220.742, Rel. Min. Néri da Silveira, julgamento em 03/03/98, Segunda Turma, DJ de 04/09/1998.
6. Existência de fonte de custeio para o direito à aposentadoria especial antes, através dos instrumentos tradicionais de financiamento da previdência social mencionados no art. 195, da CRFB/88, e depois da Medida Provisória nº 1.729/98, posteriormente convertida na Lei nº 9.732, de 11 de dezembro de 1998. Legislação que, ao reformular o seu modelo de financiamento, inseriu os §§ 6º e 7º no art. 57 da Lei n.º 8.213/91, e estabeleceu que este benefício será financiado com recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei nº 8.212/91, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição, respectivamente.
7. Por outro lado, o art. 10 da Lei nº 10.666/2003, ao criar o Fator Acidentário de Prevenção-FAP, concedeu redução de até 50% do valor desta contribuição em favor das empresas que disponibilizem aos seus empregados equipamentos de proteção declarados eficazes nos formulários previstos na legislação, o qual funciona como incentivo para que as empresas continuem a cumprir a sua função social, proporcionando um ambiente de trabalho hígido a seus trabalhadores.
8. O risco social aplicável ao benefício previdenciário da aposentadoria especial é o exercício de atividade em condições prejudiciais à saúde ou à integridade física (CRFB/88, art. 201, § 1º), de forma que torna indispensável que o indivíduo trabalhe exposto a uma nocividade notadamente capaz de ensejar o referido dano, porquanto a tutela legal considera a exposição do segurado pelo risco presumido presente na relação entre agente nocivo e o trabalhador.
9. A interpretação do instituto da aposentadoria especial mais consentânea com o texto constitucional é aquela que conduz a uma proteção efetiva do trabalhador, considerando o benefício da aposentadoria especial excepcional, destinado ao segurado que efetivamente exerceu suas atividades laborativas em “condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física”.
10. Consectariamente, a primeira tese objetiva que se firma é: o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial.
11. A Administração poderá, no exercício da fiscalização, aferir as informações prestadas pela empresa, sem prejuízo do inafastável judicial review. Em caso de divergência ou dúvida sobre a real eficácia do Equipamento de Proteção Individual, a premissa a nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial. Isto porque o uso de EPI, no caso concreto, pode não se afigurar suficiente para descaracterizar completamente a relação nociva a que o empregado se submete.
12. In casu, tratando-se especificamente do agente nocivo ruído, desde que em limites acima do limite legal, constata-se que, apesar do uso de Equipamento de Proteção Individual (protetor auricular) reduzir a agressividade do ruído a um nível tolerável, até no mesmo patamar da normalidade, a potência do som em tais ambientes causa danos ao organismo que vão muito além daqueles relacionados à perda das funções auditivas. O benefício previsto neste artigo será financiado com os recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição, respectivamente. O benefício previsto neste artigo será financiado com os recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição, respectivamente.
13. Ainda que se pudesse aceitar que o problema causado pela exposição ao ruído relacionasse apenas à perda das funções auditivas, o que indubitavelmente não é o caso, é certo que não se pode garantir uma eficácia real na eliminação dos efeitos do agente nocivo ruído com a simples utilização de EPI, pois são inúmeros os fatores que influenciam na sua efetividade, dentro dos quais muitos são impassíveis de um controle efetivo, tanto pelas empresas, quanto pelos trabalhadores.
14. Desse modo, a segunda tese fixada neste Recurso Extraordinário é a seguinte: na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.
15. Agravo conhecido para negar provimento ao Recurso Extraordinário.”
Desse modo, o Supremo Tribunal Federal fixou orientação no sentido de que, uma vez indicado no perfil profissiográfico previdenciário - PPP do segurado que o uso de equipamento de proteção individual - EPI é eficaz, ou seja, neutraliza o agente agressivo a que se submete o trabalhador, a atividade exercida não pode ser considerada especial, a não ser que esse agente seja o ruído, hipótese em que permanece a orientação de que a atividade é especial independente do uso de EPIs, tal como ocorre com o caso dos autos.
Cumpre salientar que quase toda a vida profissional do autor foi constituída pelo exercício da atividade de vigilante, mediante uso de arma de fogo. Quanto ao tema, convém registrar que tal atividade era prevista como presumidamente especial até a edição da Lei 9.032-1995, dado o enquadramento como guarda no código 2.5.7 do quadro anexo ao Decreto 53.831-1964.
Já quanto ao período posterior, a jurisprudência oscilou entre o não reconhecimento, em razão da falta de previsão da periculosidade como meio apto a caracterizar uma atividade especial nos Decretos 2.172-1997 e 3.048-1999, e o enquadramento como especial, à luz do disposto no art. 57 da Lei 8.213-1991, que assegura o direito à aposentadoria especial ao segurado que exerça sua atividade em condições que coloquem em risco a sua saúde ou a sua integridade física, nos termos dos artigos 201, § 1º, e 202, II da Constituição da República.
A fim de unificar o entendimento sobre a matéria, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça submeteu a proposta de afetação no Recurso Especial (ProAfR no REsp 1830508 - RS) nos autos do processo 2019/0139310-3, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, DJe 21.10.2019 (Decisão de Afetação – Tema 1031), vindo, em 02.03.2021, a publicar acórdão que julgou definitivamente a matéria nos autos dos processos nº REsp 1830508-RS, REsp 1831377-PR e REsp 1831371-SP, representativos da controvérsia. Na ocasião, foi firmada a tese de que “É admissível o reconhecimento da especialidade da atividade de Vigilante, com ou sem o uso de arma de fogo, em data posterior à Lei 9.032/1995 e ao Decreto 2.172/1997, desde que haja a comprovação da efetiva nocividade da atividade, por qualquer meio de prova até 5.3.1997, momento em que se passa a exigir apresentação de laudo técnico ou elemento material equivalente, para comprovar a permanente, não ocasional nem intermitente, exposição à atividade nociva, que coloque em risco a integridade física do Segurado”.
Observando tais parâmetros, verifica-se que o magistrado de primeiro grau analisou adequadamente o caso:
“No caso concreto, o autor pretende o reconhecimento dos seguintes períodos laborados como vigilante:
1) PROBAN Segurança e Proteção Bancária Ltda — 06/12/1988 a 31/08/2000 — a anotação de CTPS do evento 1, anexo 10 comprova a contratação do autor para o cargo de vigilante — o perfil profissiográfico do evento 1, anexo 15 (no PA, evento 23, anexo 1, fls. 29/31), elaborado pelo Sindicato dos Vigilantes do Município do Rio de Janeiro, informa o exercício da função de vigilante no período em tela e o uso de arma de fogo calibre 38 na atividade; não há informação sobre qualquer agente nocivo no referido documento;
2) Vila Forte Vigilância e Segurança Ltda — 13/09/2001 a 26/11/2002 — conforme o perfil profissiográfico do evento 1, anexo 16 (no PA, evento 23, anexo 1, fls. 21/22), o autor, no lapso temporal assinalado, trabalhou como vigilante e utilizou arma de fogo calibre 38 em sua função. Não há informação sobre agentes nocivos no aludido documento;
3) Vila Rio Vigilância e Segurança Ltda — 15/03/2012 a 29/07/2019 (termo final é a data de emissão do PPP) — nos termos do perfil profissiográfico do evento 1, anexo 17 (no PA, evento 23, anexo 1, fls. 23/24), o demandante, no interregno informado, exerceu a atividade profissional de vigilante com porte de arma de fogo calibre 38. Não há informação sobre agentes nocivos no aludido documento.
No que concerne ao período laborado na empresa PROBAN Segurança e Proteção Bancária Ltda a partir de 06/12/1988, cabe assinalar que o perfil profissiográfico emitido por sindicato não é válido como prova da periculosidade pelo uso de arma de fogo, pois o documento em questão não foi emitido pela empregadora do autor. De todo modo, considerando a anotação de CTPS do evento 1, anexo 10, entendo que o período laborado a partir de 06/12/1988 deve ser reconhecido, como especial, pela categoria profissional de vigilante, pela equiparação à de guarda, nos termos do código 2.5.7 do Quadro Anexo ao Decreto 53.831/64, sendo desnecessária, neste caso, a prova da periculosidade ou do uso de arma de fogo. O termo final de tal enquadramento deve ser 28/04/1995, dia imediatamente anterior ao da vigência da Lei 9.032/95, que alterou o artigo 57, § 4º, da Lei 8.213/91 para exigir a prova da efetiva exposição a agentes nocivos. Portanto, foi reconhecido, como especial, apenas o lapso temporal de 06/12/1988 a 28/04/1995.
Ainda, devem ser reconhecidos, como especiais, os períodos laborados nas empresas Vila Forte Vigilância e Segurança Ltda (13/09/2001 a 26/11/2002) e Vila Rio Vigilância e Segurança Ltda (15/03/2012 a 29/07/2019), pois os perfis profissiográficos apresentados comprovam a periculosidade da função pelo uso de arma de fogo. Entretanto, não é possível enquadrar, como especial, o interregno de 30/07/2019 a 31/07/2019, pois não há documentos nos autos que comprovem a mesma condição de periculosidade neste último lapso temporal. Não podem ser reconhecidos, como especiais, os períodos laborados na VIGIBRAS Vigilância do Brasil Ltda (27/11/2002 a 30/05/2003) e Fibra Segurança e Vigilância Ltda (02/06/2003 a 13/07/2006), pois estes são posteriores à vigência da Lei 9.032/95 e o postulante não juntou documentos para comprovar o uso de arma de fogo nem a periculosidade por outros motivos.
Noto, também, que o autor pretende o reconhecimento, como especial, do interregno laborado na empresa BR-Borracha Regenerada Ltda (02/06/1988 a 09/09/1988), com base no código 2.3.3, sem ter sido especificado o decreto a que se refere. O postulante não apresentou perfil profissiográfico nem outros documentos para comprovar atividade especial em tal intervalo e, na anotação de CTPS do evento 1, anexo 12, é possível verificar que o autor trabalhava como auxiliar de portaria. O item assinalado no Decreto 53.831/64, diz respeito, dentre outros, a trabalhadores em edifícios, mas não a porteiros, pois o item geral 2.3.0 é referente à perfuração, à construção civil e assemelhadas e não guarda relação com a atividade desempenhada pelo autor. Já o código 2.3.3 do Anexo II do Decreto 83.080/79 é relativo a mineiros de superfície e não possibilita o enquadramento, como especial, da atividade de auxiliar de portaria. Por conseguinte, o período mencionado neste parágrafo deve ser considerado comum.
Em suma, foram reconhecidos, como especiais, os seguintes períodos:
— PROBAN Segurança e Proteção Bancária Ltda — 06/12/1988 a 28/04/1995;
— Vila Forte Vigilância e Segurança Ltda — 13/09/2001 a 26/11/2002;
— Vila Rio Vigilância e Segurança Ltda — 15/03/2012 a 29/07/2019.
O fator de conversão a ser aplicado é o de 1,40 (artigo 70 do Decreto 3.048/99), pois se trata de segurado do sexo masculino e ainda porque a profissão de vigilante, por equiparação à de guarda, e a periculosidade porventura existente no exercício desta função davam ensejo à concessão de aposentadoria especial com 25 anos de serviço.
De acordo com o arrazoado nesta sentença, foi elaborado o cálculo a seguir, considerando os períodos laborados até a DER (31/07/2019) e desprezando os períodos concomitantes:
[...]
Deste modo, restou apurado que o autor completou, até 31/07/2019, completou 35 anos, 4 meses e 6 dias, tempo suficiente para a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição integral.
Logo, deve ser julgado procedente, em parte, o pedido, para condenar o INSS a implantar, em favor do demandante, o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição integral, com DIB em 31/07/2019.
Tendo em vista o disposto no artigo 124, inciso I, da Lei 8.213/91, deverá ser cancelado o auxíliodoença NB 634.581.523-7 (evento 51) e deverão ser descontados, dos atrasados devidos pela aposentadoria por tempo de contribuição, os valores recebidos mês a mês pela concessão do benefício por incapacidade, compreendidas entre 01/04/2021 e a data da efetiva implantação da aposentadoria.”
Feitas tais ponderações, observa-se que, no caso concreto, os períodos trabalhados pelo autor como vigilante, de 06.12.1988 a 28.04.1995, 3.09.2001 a 26.11.2002 e 15.03.2012 a 29.07.2019, foram admitidos como especiais em razão de os respectivos perfis profissiográficos previdenciários – PPPs (Evento 23) informarem o caráter perigoso da atividade exercida, cujo somatório de tempo de contribuição especial foi o suficiente para completar os 35 (trinta e cinco) anos necessários para a aposentação.
Quanto aos juros da mora e à correção monetária incidentes sobre as diferenças devidas, convém relembrar que: 1) o Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo, no julgamento do RESP 1.205.946 (DJ de 02.02.2012), firmou entendimento de que o artigo 5º da Lei nº 11.960-2009, de 30.06.2009, que conferiu nova redação ao artigo 1º-F, da Lei 9.494-97, é norma de natureza eminentemente processual, com aplicação imediata aos processos pendentes: 2) ao apreciar conjuntamente as Ações Diretas de Inconstitucionalidade nº 4357 e 4425, em julgamento concluído em 13.03.2013, o Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade, em parte e por arrastamento, do artigo 1º-F da Lei nº 9.494-97, com a redação que lhe foi dada pelo artigo 5º pela referida Lei nº 11.960-2009, sob o entendimento de que ofende ao princípio da isonomia (caput do artigo 5º da Constituição da República) a adoção dos índices de remuneração básica da caderneta de poupança para fins de correção monetária das dívidas fazendárias de qualquer natureza, afastando, assim, a aplicação da Taxa Referencial – TR nesses casos; 3) em sessão plenária de 20.09.2017, a Corte Suprema, por maioria, e nos termos do voto do Relator, Ministro Luiz Fux, apreciando o mérito da questão controvertida no RE 870947 (Tema nº 810), submetido ao procedimento da repercussão geral, firmou a tese de que “o art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII)”; 4) Interpostos quatro embargos de declaração do acórdão proferido no RE 870947, foram todos desprovidos em decisão proferida 03.10.2019 (publicação em 30.02.2020, trânsito em julgado na data de 03.03.2020), na qual foi afastada a possibilidade de modulação dos efeitos do acórdão que apreciou o mérito daquele Recurso Extraordinário; 5) por seu turno, o Colendo Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar o Recurso Especial 1495146, submetido ao procedimento dos recursos repetitivos (Tema nº 905, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, julgamento em 20.02.2018, publicação em 02.03.2018, trânsito em julgado na data de 13.09.2018), fixou os índices que a serem aplicados às condenações da Fazenda Pública, de acordo com a sua natureza. Nos casos das condenações de natureza previdenciária, como na presente hipótese, essa Corte Superior estabeleceu o INPC como critério de correção no que se refere ao período posterior à vigência da Lei nº 11.430-2006, que incluiu o artigo 41-A na Lei nº 8.213-91 (item 3.2 da tese firmada pelo STJ). Para as condenações referentes a benefícios assistenciais, em sintonia com o que também determinou o STF no caso concreto apreciado no Recurso Extraordinário nº 870947, foi mantido o IPCA-E, índice aplicável às condenações de natureza administrativa em geral (item 3.1 da tese firmada pelo Superior Tribunal de Justiça).
Conclui-se, portanto, que a nossa Corte Suprema, ao julgar o mérito do Recurso Extraordinário nº 870947 (Tema nº 810) na data de 20.09.2017, fixou tão somente a tese da inconstitucionalidade do artigo 1º-F da Lei nº 9.494-97 na parte em que trata da correção monetária, sem pronunciar, em sede de repercussão geral, qualquer índice em substituição. Por decorrência lógica dessa constatação, deve prevalecer o índice de atualização monetária estabelecido pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Recurso Especial 1495146 (Tema nº 905), para as condenações de natureza previdenciária, qual seja, o INPC.
Diante dessas premissas, a correção monetária e os juros da mora deve ser calculada de acordo com o item 4.3 do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal de 2013 (Resolução nº 267, de 02.12.2013, do Conselho da Justiça Federal).
Por fim, impõe-se a aplicação também do Enunciado nº 56 da Súmula deste Tribunal Regional da 2ª Região, a reconhecer que: “É inconstitucional a expressão ‘haverá incidência uma única vez’, constante do art. 1°-F da Lei N° 9.494/97, com a redação dado pelo art. 5° da Lei 11.960/2009”.
Compulsando os autos, verifica-se que a sentença obedeceu à sistemática definida por nossas Cortes Superiores no que tange à correção monetária e aos juros incidentes sobre os valores devidos, inexistindo fundamento para modificá-la, nesse aspecto.
Isso posto, voto no sentido de negar provimento à remessa necessária.