Documento:20002252212
Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 2ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000666-54.2024.4.02.9999/RJ

RELATOR: Juiz Federal GUSTAVO ARRUDA MACEDO

APELANTE: JURANDIR PINTO DA FONSECA

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

VOTO

Quanto ao mérito do direito pleiteado, para a concessão de benefício assistencial, deve ser observado o que dispõe a Lei 8.742/93, precipuamente o que é estabelecido em seus artigos 2º e 4º, tudo em consonância com o art. 20 da mesma lei, de onde se extraem os requisitos para a sua concessão.

Possuindo caráter exclusivamente assistencial, o benefício de prestação continuada (BPC) previsto na Lei 8.742/93, é concedido pelo Estado, independentemente de contribuição, e tem como objetivo, garantir o atendimento às necessidades básicas do cidadão que não possui meios de prover o seu próprio sustento, nem pode contar com a ajuda de seus familiares.

Para a concessão do mesmo, é necessário o preenchimento dos seguintes requisitos:

1) ser portador de deficiência ou idoso com 65 (sessenta e cinco) anos de idade ou mais (art. 34 do Estatuto do Idoso - Lei n.º 10.741 de 01.10.2003);

2) não possuir meios de subsistência próprios ou de tê-la provida por sua família (art. 203, V, CF), cuja renda mensal per capita seja inferior a ¼ do salário-mínimo (art. 20, § 3º, da Lei n.º 8.742 de 07.12.1993).

Registre-se que a renda familiar superior à previsão legal de ¼ do salário-mínimo per capta não afasta a possibilidade de se provar, no caso concreto, a incapacidade da parte de prover sua manutenção ou de tê-la provida por sua família. Esse entendimento encontra esteio na jurisprudência do STF na Rcl. 4374 e nos RE nº 567.985 e 580.963.

No que diz respeito ao critério da deficiência, atualmente, o dispositivo em exame encontra-se vigendo com a redação conferida pela Lei n. 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), a qual explicitou a definição legal de pessoa com deficiência:

"Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas."

De se registrar que o § 10 do mesmo dispositivo, incluído pela Lei n. 12.470/2011, considera de longo prazo o impedimento cujos efeitos perduram pelo prazo mínimo de 02 (dois) anos.

A princípio, em demandas onde se pleiteia a implementação de benefícios desse tipo, é de fundamental importância a perícia médica e o estudo social, de modo a amparar a decisão do juízo.

No caso concreto, segundo exposto no Estudo Social, o autor, com a idade atual de 66 anos “vive só, em imóvel próprio, simples. Pelo observado na visita domiciliar, as condições habitacionais são razoavelmente satisfatórias. A moradia é dividida em quatro cômodos pequenos: uma cozinha, uma sala, um quarto e um banheiro, que são pouco ventilados, com baixa luminosidade, apresentando umidade/ infiltração. O mobiliário e eletrodomésticos existentes são básicos, tais como uma cama, fogão, mesa, televisão e geladeira. A cobertura da casa é de laje e o piso é revestido de cerâmica. É abastecida de energia elétrica e água encanada. Situa-se em um morro muito íngreme, o que dificulta a mobilidade do idoso para acesso aos serviços públicos essenciais, tais como Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) e Secretaria Municipal de Saúde”. “Foi efetuada a inscrição do idoso no Cadastro Único do Governo Federal para Programas Sociais (Cad’Único) e a renda mensal é proveniente do benefício Auxílio Brasil, no valor de R$ 600,00.” “É acometido de baixa importante da visão em ambos os olhos, possuindo ausência de percepção luminosa no olho esquerdo e subvisão com o diagnóstico (CID 10 F H54), o que o enquadraria no conceito de Pessoa com Deficiência”. Antes de requerer o benefício, exerceu o “ofício de Vigilante, Auxiliar de Almoxarifado, Auxiliar de Serviços Médicos e Massagista. O último vínculo empregatício formal data de 1985.

Afirmou o idoso na entrevista social “possuir muitas dificuldades para suprir as despesas mensais com necessidades básicas, como luz elétrica, água, gás e a alimentação, considerando que a renda é proveniente de forma exclusiva do Auxílio – Brasil”.

Concluiu o Assistente Social que “considerando o contexto socioeconômico do Sr. Jurandir, sua situação de vulnerabilidade em razão da condição de pessoa idosa, sem nenhuma renda, com diagnóstico (CID 10 H54), que dificulta a inserção no mercado de trabalho, sugere – se, salvo melhor juízo, o deferimento do pedido postulado pelo mesmo, no intuito de que o BPC se traduza na garantia de sua dignidade”.

Já quanto ao estado de saúde do autor, consta nos autos (Documento juntado ao evento 11, PROCJUDIC1 - fl. 76, e não rechaçado pela autarquia), datado de que o autor já possuía, aos 64 anos, baixa importante da visão em ambos os olhos (Olho direito - 20/400 e olho esquerdo com ausência de percepção luminosa - CID 10 H54), o que o impossibilitava de exercer atividades profissionais. Concluindo o perito que o autor apresenta incapacidade total e temporária, deveria ser reavaliado em 02 anos a partir daquela data.

No presente caso de pedido de Benefício Assistencial, assim como, nas questões relacionadas aos benefícios por incapacidade permanente ou temporária, é importante lembrar que na análise de documentos, o Juízo não está adstrito ao conteúdo do laudo pericial, quando existem documentos de mesma qualidade, força e peso probatório, nos quais, experts da área médica em objeto, apontam em sentido contrário, ou até no mesmo sentido, assim como, das circunstâncias em que se encontra a parte autora, dentro da ponderação de cada prova na análise da concessão do benefício pleiteado.

Nesse sentido é que, da importância da análise da prova conjunta de todos os documentos apresentados, assim como, da conclusão dos profissionais que objetivamente atuaram e contribuíram ao exame da questão, conclui-se que o autor, já com 66 anos, com as doenças que possui, relacionadas ao avançar da idade, e a baixíssima expectativa de ser ofertante de mão de obra, não possui meios de prover o seu próprio sustento, nem pode contar com a ajuda de seus familiares, se enquadrando, portanto, como possuidor do direito pleiteado na inicial.

Quanto a data do início do benefício, o documento que demonstra a baixa acuidade visual do autor, datado de 25/08/2022, foi emitido posteriormente a data do requerimento administrativo, o que portanto, permite a fixação da DIB na data da citação, em analogia com a tese firmada no Tema 626 do STJ.

Quanto à correção das diferenças devidas, devem ser respeitados os critérios expressos no manual de cálculos da Justiça Federal, assim como, no que concerne aos critérios trazidos pela edição da Lei 11.960/2009, as orientações firmadas nos Temas 810 do STF e 905 do STJ, afastando-se a TR na correção monetária dos valores em atraso, substituindo-a pelo IPCA-E, por se tratar de benefício assistencial, até a edição da EC 113/2021, momento a partir do qual será utilizada a SELIC.

Honorários fixados em liquidação de sentença, na forma do art. 85, §§ 3º e 4º do CPC, a incidir sobre o total de diferenças devidas, respeitado o limite trazido pela Súmula 111 do STJ.

 

CONCLUSÃO

Voto no sentido de dar provimento ao recurso, de modo a determinar à autarquia que conceda o benefício assistencial ao autor, na forma supra.



Documento eletrônico assinado por GUSTAVO ARRUDA MACEDO, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 2ª Região nº 17, de 26 de março de 2018. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc.trf2.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 20002252212v4 e do código CRC 1fdf22bb.

Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): GUSTAVO ARRUDA MACEDO
Data e Hora: 18/02/2025, às 12:53:36

 


 


Documento:20002252213
Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 2ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000666-54.2024.4.02.9999/RJ

RELATOR: Juiz Federal GUSTAVO ARRUDA MACEDO

APELANTE: JURANDIR PINTO DA FONSECA

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

EMENTA

DIREITO PREVIDENCIÁRIO E ASSISTENCIAL. RECURSO DE APELAÇÃO. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA – BPC/LOAS. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. VULNERABILIDADE SOCIAL COMPROVADA. RECURSO PROVIDO.

I. CASO EM EXAME

  1. Recurso de apelação interposto por Jurandir Pinto Fonseca contra sentença que julgou improcedente seu pedido de concessão do benefício assistencial de prestação continuada (BPC/LOAS), nos termos do art. 487, I, do CPC. O autor sustenta que preenche os requisitos legais para a obtenção do benefício, pois é pessoa com deficiência e encontra-se em situação de vulnerabilidade social, sem meios próprios para prover seu sustento.

II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO

  1. Há duas questões em discussão: (i) definir se o autor preenche os requisitos para a concessão do benefício assistencial, considerando sua condição de saúde e sua situação socioeconômica; (ii) estabelecer a data de início do benefício e os critérios de correção monetária das diferenças devidas.

III. RAZÕES DE DECIDIR

  1. O benefício assistencial previsto na Lei nº 8.742/93 (LOAS) possui caráter não contributivo e destina-se a idosos acima de 65 anos ou a pessoas com deficiência que comprovem não possuir meios de prover a própria subsistência nem contar com o auxílio de sua família.

  2. O requisito da deficiência é preenchido pelo autor, que possui baixa importante da visão em ambos os olhos (CID 10 H54), apresentando ausência de percepção luminosa no olho esquerdo e subvisão no olho direito, condição que o impede de exercer atividade laborativa.

  3. O requisito socioeconômico também está satisfeito, pois o autor, idoso de 66 anos, vive sozinho e sobrevive exclusivamente com R$ 600,00 provenientes do programa Auxílio Brasil, conforme estudo social. A jurisprudência do STF reconhece que o critério da renda per capita inferior a ¼ do salário-mínimo não é absoluto, admitindo-se a análise do caso concreto para aferição da vulnerabilidade (STF, RE nº 567.985 e 580.963).

  4. A data de início do benefício deve ser fixada na data da citação, pois o documento que atesta a baixa acuidade visual do autor foi emitido posteriormente ao requerimento administrativo, em conformidade com o Tema 626 do STJ.

  5. As diferenças devidas devem ser corrigidas pelo IPCA-E até a edição da EC 113/2021 e, a partir de então, pela SELIC, nos termos dos Temas 810 do STF e 905 do STJ.

  6. Os honorários advocatícios devem ser fixados em liquidação de sentença, conforme o art. 85, §§ 3º e 4º, do CPC, observando-se o limite imposto pela Súmula 111 do STJ.

IV. DISPOSITIVO E TESE

  1. Recurso provido.

Tese de julgamento:

  1. O benefício assistencial de prestação continuada deve ser concedido ao idoso ou à pessoa com deficiência que, embora possua renda per capita superior a ¼ do salário-mínimo, comprove estar em situação de vulnerabilidade social.

  2. A fixação da data de início do benefício pode ser estabelecida na data da citação quando o documento que comprova a deficiência ou a vulnerabilidade socioeconômica for posterior ao requerimento administrativo.

  3. A correção monetária das diferenças devidas deve observar o IPCA-E até a edição da EC 113/2021 e, a partir de então, a SELIC.


Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 203, V; Lei nº 8.742/93, art. 20; Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/2003), art. 34; CPC, art. 85, §§ 3º e 4º.

Jurisprudência relevante citada: STF, RE nº 567.985 e 580.963; STJ, Tema 626; STF, Tema 810; STJ, Tema 905; STF, Rcl. 4374.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 10ª Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento ao recurso, de modo a determinar à autarquia que conceda o benefício assistencial ao autor, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Rio de Janeiro, 25 de março de 2025.

 


 


Documento:20002252211
Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 2ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000666-54.2024.4.02.9999/RJ

RELATOR: Juiz Federal GUSTAVO ARRUDA MACEDO

APELANTE: JURANDIR PINTO DA FONSECA

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por JURANDIR PINTO FONSECA em face da sentença (evento 11, PROCJUDIC1 – fls. 90/91) pela qual, o MM. Juiz de Direito da Vara Única da Comarca de Itaocara - RJ, julgou improcedente o pedido, e extinto o feito com resolução de mérito, nos termos do inciso I do artigo 487 do Código de Processo Civil. Em pedido ajuizado em face do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, a fim de compelir o réu a conceder, imediatamente, o benefício previdenciário da prestação continuada - LOAS (Lei nº 8742/93).

Em suas razões de recorrer (evento 11, PROCJUDIC1 – fls. 95/98) o apelante alega que na sentença recorrida, o magistrado de 1º grau julgou o caso “em desarmonia com as provas produzidas, bem como com o direito”.

Para tal sustenta que:

a) “O apelante é portador de BAIXA IMPORTANTE DA VISÃO EM AMBOS OS OLHOS, POSSUINDO AUSÊNCIA DE PERCEPÇÃO DE LUMINOSA NO OLHO ESQUERDO E SUBVISÃO (CID 10 H54), doença que o incapacita de exercer atividade laborativa, além de estar inserida em família vulnerável”.

b) “O perito concluiu, em sede judicial, “que o apelante está totalmente incapacitado de exercer atividade laborativa, conforme se depreende da conclusão do laudo pericial”.

c) “Quanto à condição socioeconômica do apelante, do parecer social apresentado fica evidente sua vulnerabilidade social. O requerente, que reside só, sobrevive com o valor de R$600,00 oriundo de Programa Federal de transferência de renda, o que, pela sua natureza, não entra no cômputo da renda familiar”.

Ao final conclui que “desse modo, resta evidente que o requerente preenche os requisitos legais para a percepção do benefício de prestação continuada”.

 

É o relatório. Peço dia para julgamento.



Documento eletrônico assinado por GUSTAVO ARRUDA MACEDO, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 2ª Região nº 17, de 26 de março de 2018. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc.trf2.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 20002252211v3 e do código CRC 41b7cb25.

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Signatário (a): GUSTAVO ARRUDA MACEDO
Data e Hora: 18/2/2025, às 12:53:36